segunda-feira, 28 de julho de 2008

SIM, O MAR

Verão, Sol radioso de mil reflexos sobre a água, praia dourada aos pés de crianças que correm despreocupadas, banhistas destemidos em mergulhos arrojados, mulheres esculturais em passo elegante, provocador, pranchas de surf no horizonte, ondas de espuma branca, quase imaculada.
Verão, barracas de campismo selvagem, latas de atum e fogueiras ateadas nos confins da memória. Um tempo em que tudo era dourado e promissor. Partidas intermináveis de futebol, sem canseira. Os amigos, as longas conversas deitados no areal húmido da noite, os namoros e as paixões, o calor e a água fria para refrescar. A humidade inesperada de uma generosidade feminina. Ao longe um rádio canta uma canção dos Xutos: “É amanhã dia 1 de Agosto, E tudo em mim é um fogo posto…” E amanhã haveria se houvesse, não era importante, não era “agora”.
Praia, pequenos pés a correr atrás de uma bola, perguntas infinitas, chuvas de “porquês” de uma réplica nossa, minha, em ponto pequeno. O bater dos pés e o ensino para perder o medo, o mexer dos braços, as primeiras braçadas, um Ser em crescimento.
Verão, mulheres gordas com impinges salteadas no rosto a bater palmas e a chafurdar num gelado, cães coxos a vadiar pela praia, um anão zangado numa paragem de camioneta que não chega, barulhos de cantores pimba no ar como anúncios de invasão eminente, piqueniques de saloios que deixam um rasto de lixo à medida que se movimentam e um cão coxo a vadiar na praia, focinho no ar como quem procura. Ondas de um metro e pouco, água fria demais, casais de namorados, a arrulhar no patético da sua condição de felicidade, miúdos com panamás maiores que a cabeça a encher baldes de areia, excursões de creches como pequenos exércitos, linhas que desenham a praia de cima para baixo e vice-versa, e um cão, coxo que caminha com o focinho no ar.
Verão, aparente encontro da descontracção com o lazer, época ideal para zangas familiares, foguetada nas aldeias e fogo nas florestas. Bombeiros e população, população e bombeiros, e jornalistas e grande confusão num cenário de noite escura iluminada pelo dourado das chamas. E a correr passa pela câmara um cão coxo de focinho no ar meio assustado, meio à procura. E um coelho sempre atrasado que não consegue explicar para onde se dirige, e dois idosos a tentarem um equilíbrio difícil no encontro acidentado dos corpos nus cobertos de pregas que o tempo foi desenhando.
E o Mar, sempre o Mar a dançar à minha frente, o filme de uma existência, o mapa de uma Vida, o Mar sempre que caminho atrasado para chegar a lugares que não sei onde ficam, de focinho no ar a cheirar não sei o quê, à procura do que não consigo achar. O mar, sim, o mar…

ARTUR

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