sábado, 23 de fevereiro de 2008

MONTANHA MÁGICA


O homem chegou ao cimo da montanha e respirou de alívio por lá ter conseguido chegar. Olhou em redor a paisagem infinita e implacavelmente bela que se estendia aos seus pés. Encheu os pulmões de ar e resolveu manter-se de pé dada a solenidade do momento.
O homem chegou ao ponto mais alto onde as pernas lhe permitiram chegar e encarnou a subida de outros homens como ele, há muito desaparecidos daquela paisagem. Homens que anteviram nos sentidos a aproximação trágica de tempestades desencadeadas por outros homens, que não conseguiram avisar ou que não os quiseram ouvir… E sentiu-se pequeno, insignificante, incapaz de fazer a diferença num mundo construído e destruído por homens iguais a eles.
O homem reflectiu no alto da montanha e lembrou-se de todos aqueles que amou e que o amaram e sentiu-se tranquilo, amparado, parte de uma família cujo Amor não cabia na dimensão daquela paisagem. Um sentimento universal que se expandia como epidemia pelas estrelas e pelo cosmos fora como uma força sem fim.
O homem olhou do alto da montanha e percebeu que, tal como agora se sentia muito acima da Terra, mais tarde ou mais cedo, essa mesma Terra viria reclamar a casca que lhe permitiu subir até ali. E sentiu-se dividido, entre o Céu e a Terra. Se o corpo lhe facultava a possibilidade da escalada bem sucedida, era o Ser que lhe permitia encontrar no horizonte infinito uma parte importante de que era feito.
O homem sorriu no alto da montanha e um sopro de divindade atravessou-lhe as entranhas como que a lembrar-lhe a centelha de vida eterna que ardia nele.
O homem abriu os braços e percebeu que, tal como o céu e a terra, nada nunca era definitivo. A vida talvez terminasse no correr do seu ciclo previsível. O Ser era eterno.
A montanha lembrou-lhe algumas noções que a vida o tinha feito esquecer.
ARTUR
(foto de Sofia P.Coelho)

5 comentários:

Anónimo disse...

Artuuuuur, voltou e de que maneira, foooogo, MA RA VI LHO SO !! anda a ler Eckhart Tolle ?? aconselho ! das duas uma, ou o Artur caminha para Lá ou já Lá chegou... acho que sabe o que quero dizer. Não perca “Into the Wild” com banda sonora de Eddie Vedder que o torna ainda mais brilhante. É um filme onde esta escalada está presente em cada “frame”. Beijos e quero mais destes....

reflexão: estou sempre a aconselhar isto e aquilo....se calhar tenho de me deixar disso, não quero parecer pretensiosa, é só mesmo porque vem a calhar.

redjan disse...

art: que bom escalar em ideias e palavras assim ....

Artur Guilherme Carvalho disse...

Sara: o tempo de hoje é, no meu modesto entender, a exaltação da eternidade do Ser, antigo conceito filosófico desenvolvido pelos filósofos do romantismo alemão (ex: Schopenhauer, Nietzsche) dos finais do séc.XIX. Ante as catástrofes que se adivinhavam e um modo de vida que terminava, ao Homem restava-lhe a solidão de si próprio. Nesse espaço descobria que a vida tem fim mas que o Ser é eterno.
Jan:Manda sempre.Obrigado pela fidelidade de leitor e amigo. Um abraço.
ARTUR

Anónimo disse...

Sim, vivemos numa nova Era. A exaltação do Ser, no meu ainda mais modesto ponto de vista, remota pelo menos a 2600 anos antes de Cristo, altura que nasceu o Budismo.Todos os profetas que lhe seguiram (incluíndo JC) viveram e ensinaram a viver nesse estado de Iluminação. Não existe solidão quando se vive no Ser, e é esse caminho que está a despertar consciências por esse mundo fora. E agora lá venho eu, leia o Siddhartha de Hermann Hesse, também alemão, nasceu no fim do séc. 19 e foi prémio Nobel da literatura e escreveu um dos mais belos livros que já li. É um conto sobre a escalada da montanha, o encontro com o Ser e da felicidade que apenas se encontra no Ser, e não no Ego...e que Egos que há por aí !! Beijos

Anónimo disse...

Correcção de calinada: Buda viveu 600 ac e não 2600. Bj