domingo, 2 de dezembro de 2007

BEM VINDA POLÉMICA

Após o lançamento do último romance de Miguel Sousa Tavares (MST), “Rio das Flores” a polémica inaugurada mais atrás com Vasco Pulido Valente (VPV) a propósito do outro romance (“Equador”) ganhou novo ânimo, devidamente incitado pela Comunicação Social. Não vou aqui tomar partido ou sequer estar de acordo com quem quer que seja. Resolvi escrever esta crónica precisamente para saudar a polémica entre eles, na medida em que, com ela acontece algo de diferente no pântano da literatura portuguesa. E porquê? Porque sou leitor e apreciador do trabalho de ambos na medida em que reconheço o importante contributo que, cada um à sua maneira, deu à cultura portuguesa. Por mais defeitos que possam ter (e serão vários) ambos conseguem pôr milhares de pessoas a ler e despertar a curiosidade em outro tanto. MST abriu caminho com “Equador” à possibilidade de outros autores se poderem aventurar no espaço literário da reconstituição histórica como, p. ex., o aqui já referido “O Tempo dos Amores-Perfeitos” de Tiago Rebelo entre outros. O género, que não era nada de novo, com a popularidade de MST ganhou asas para outros voos e isso é sempre um facto bom de assinalar. Se a 1ª edição de “Equador” tinha algumas gralhas quanto á precisão histórica, melhor. Para alem de poderem vir a ser corrigidas em edições posteriores, passaram também a integrar conversas de café entre os leitores, amigos e admiradores. Outra grande vantagem dos romances de MST prende-se com o facto de os leitores terem uma possibilidade de (re) conhecer uma época não tão distante como isso da nossa História que se calhar de outro modo não se preocupariam em esclarecer, isto é, as últimas décadas do séc. XIX e a primeira metade do séc. XX.
Quanto a VPV, li dois títulos dele, dois tratados de História, sérios, limpos e intelectualmente honestos. O historiador simplifica (é essa a obrigação de qualquer cientista) o discurso histórico e torna-o acessível a uma maioria de pessoas, torna compreensível para aqueles formados noutras áreas, noutros departamentos de conhecimento.
Têm de comum pouca ou nenhuma tendência para seguir a carneirada, ser politicamente correctos ou sentarem-se à mesa da travessa que o Poder lhes possa estender. MST conseguiu um best-seller, vamos ver o que acontece no segundo. Melhor para ele. VPV não abdica de uma lúcida capacidade de análise nas suas crónicas do Público, irritado umas vezes, conformado outras, mas sempre fiel a si próprio e às suas convicções.
Saúdo esta polémica porque estou farto de ver a literatura, bem como quase todas as outras dimensões da nossa vida, serem tratadas como simples joguetes do diálogo entre a oferta e a procura; porque estou farto de que as livrarias insistam em tratar os livros como se fossem iogurtes ou batatas… PORQUE NÃO SÃO… têm o seu espaço próprio na edificação de uma civilização; porque estou farto de andar à procura de alguns clássicos e de me olharem com um ar de espanto como se estivesse a querer comprar guarda-chuvas numa livraria; porque estou farto de ver ilustres desconhecidos que de repente se tornam grandes escritores, ganham prémios e cujo único mérito é fazerem parte de uma pandilha institucionalizada que os promove e divulga…porque sim. Uma pandilha onde só entra quem eles deixam, só eles é que sabem e que julga controlar todas as entradas e saídas da Literatura Portuguesa; porque estou farto das santanettes que um dia acordaram e decidiram tornar-se escritoras como eu decido se levo esta ou aquela camisa vestida para a rua. Porque era giro e dava montes de piada e…; porque estou farto da tendência editorial que gosta de editar “o que está a dar” para depois se desculpar com a vontade do público; Mas qual vontade?? Tal como a opinião pública é aquela que se publica, as verdades do mercado são as verdades da feira onde vende mais quem mais alto gritar e espetar o produto na cara do cliente. É um jogo com cartas marcadas. Felizmente aumentou o nº de leitores, felizmente vão aparecendo polémicas que fazem as pessoas pensar, ter interesse, procurar. Felizmente há um espírito que não morre, antes definha mas não se extingue, como uma vela teimosa a resistir contra as correntes de ar. Felizmente há uma polémica que nos enquadra em torno de coisas que interessam como o descobrir da História, da Língua e da Identidade. Itens que não estão à venda em nenhuma feira nem em nenhum fornecedor perto de si.
ARTUR

2 comentários:

Carlos Lopes disse...

Os dois ao estalo e em directo na TVI é que era giro;-)

Artur Guilherme Carvalho disse...

CL: Ao menos a Literatura está viva. Irra! Às vezes parece que nos afundámos definitivamente. Apetece-me gritar no alto da montanha. AAAAHHHHHH!!!!
ARTUR