quarta-feira, 22 de setembro de 2021

#4 Considerações: Cul-de-Sac

 10. 

Por isso, aqui vos digo que há que resistir e lutar, fazer arte da vida, que é esse combate. É que a raiz de todo o mal é o desespero. Em primeiro lugar, o desespero de ser. Em segundo, o de padecer, e em terceiro, o de aguardar tudo o que é nefasto e pesado de malogro e que encerra a luz em um espaço diminuto onde se nem consegue respirar. 

11. 
Mas, ainda, há o letargo. Outro modo da desistência ante tudo o que oprime. É bem verdade, que o cansaço sobrevém a tanta luta, é na altura em que se baixam os braços, se descrê no futuro, tudo é um horizonte gris perante tal malogro, a aprazada queda, a inutilidade de agir. Não se tiram nunca férias da existência. Há que porfiar mais um dia, sempre mais um dia, sem uma suspensão agregadora de forças, pausa lustral, ou sequer um corte com a circunstância. É um fluido contínuo, ainda que cíclico, sem nenhuma possibilidade de obter uma verdadeira perspectiva, externa ao si, em suspensão benéfica, imobilista. Sim, o Santo Imobilismo também é ou pode ser isso. É o seu lado salutar e bom, ultrapassado o evitamento sistemático gerado pelo medo, é um imobilismo produtivo, mas como deveis calcular, improvável ou até impossível. 
 
12. 
A angústia é mesmo um aperto. Invade o espaço vital. Torna-se totalitária. Contínua. Coisa outra, toda outra, seria um hausto livre, entusiasmo e ar aberto. Um conceito vivido de radical abertura. Sim, sem peso e pavor e ainda assim, com a âncora telúrica a emprestar densidade ao mundo visto pela lente onírica da possibilidade. Não mais esse abatimento falho de energia, um letargo absoluto que vê passar o tempo como de longe e que, depois, se questiona para onde foi. E o tempo é rio-de-sentido-único, não se repete e não volta, não se acelera nem se sustém a não ser pelas variações subjectivas da sua observação. E esta observação alheada fá-lo rapidíssimo e difuso ou, por vezes, suspenso, estagnado e muito triste. E, nem assim, lhe captamos a demora.

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