sábado, 30 de janeiro de 2021
ENTRE NEVOEIRO E GOTAS DE CHUVA
sexta-feira, 22 de janeiro de 2021
JEAN GRATON
Foram horas e horas de leitura, de fascínio, emoção e aventura desde o final da infância e através de toda a adolescência. As máquinas, os circuitos, os Grande Prémios, a Formula 1, os personagens perfeitamente normais compostos de falhas e virtudes como toda a gente. A transcrição dos sons dos carros, o VRRROOARR do arranque o Bing do choque metálico, as viagens pelo planeta na senda dos roteiros do automobilismo, a paixão pela Ferrari, pelo Gilles Villeneuve, e tanta coisa que me ajudou a crescer, a alargar horizontes... Por tudo isto e muito mais que me esqueci de lembrar....
Muito obrigado Jean Graton
quarta-feira, 20 de janeiro de 2021
A JARDINAR MAIS DO QUE A ESCREVINHAR
sexta-feira, 15 de janeiro de 2021
QUALQUER COISA QUE INSISTE EM SE FECHAR...
A Paciência saiu de manhã sem grande ruído, pouco depois de me ter levantado. Não me conseguia aturar mais, queria outra coisa da vida, ia seguir um rumo novo e aquelas coisas que se costumam dizer quando deixamos alguém para trás. Fiquei ali preso àquela cena matinal, de roupão vestido e caneca de café esquecida na mão em forma de esboço de um adeus que não cheguei a dizer. Acompanhei-lhe o movimento com o saco na mão a entrar para o carro. Acho que todos temos o direito de chegar como de partir já que nenhum de nós consegue durar para sempre e fui-me enchendo de razões, lugares comuns e frases feitas para conseguir acordar e voltar à vida. Sentado na mesa da cozinha vejo a porta que se vai descascando de tinta e artroses de madeira à medida que perde a forma. Mal se consegue fechar a não ser com um empurrão firme. Envelhece em silêncio, como o café que arrefece, como a casa, como eu. Tudo desliza devagarinho para o grande nada de onde veio. Ainda fui sair duas ou três vezes com a Depressão mas rapidamente nos apercebemos que não ia resultar. Tudo correu mal. Às vezes falo com a minha tia Esperança mas é difícil porque está cada vez mais surda. Obriga-me a repetir as coisas, a falar alto e isso cansa-me. Lembro-me das mãos delas a fugir para dentro como um líquido que se vai escoando, os ossos dos dedos a espreitar por baixo da pele, a falta de força.
A verdade é que não me apetece falar com ninguém. Esgotei as palavras, as razões e os sentidos, e a única coisa que quero é ficar em silêncio dentro desta casa sem fazer nada, sem pensar, enquanto as minhas mãos se vão escoando num movimento de maré vaza deixando mais salientes os ossos dos dedos, evidenciando um fim de um ciclo. Já se gastaram todas as conversas, já se deu várias vezes a volta às coisas e pouco ou nada mudou. Talvez a tecnologia…vagamente a tecnologia, o que é manifestamente pouco para o esforço de um ciclo inteiro. Por isso é em silêncio que gosto de estar, nessa casa envelhecida pelo tempo onde a luz entra de manhã e se retira ao fim da tarde sem fazer perguntas. Nesse lugar onde os móveis, os retratos em cima da mesa da sala, os estalos do soalho…onde nada existe para além de existir simplesmente. Não há ordens, obrigações, urgências. Há estes breves diálogos com os cantos, estes breves pensamentos que saem e entram como os pássaros habituados ao telhado da garagem. Tudo vai existindo simplesmente até deixar de existir e não há nenhum problema com isso. A porta da cozinha vai deixando de conseguir fechar, vai encolhendo, a casa vai encolhendo e eu lá dentro. Ao fim de algum tempo em silêncio fico na dúvida: serei eu algum ser que existe ou simplesmente uma coisa que cumpre a sua função, que é apenas respirada? Farta de me aturar a Paciência partiu. Não a posso censurar. Qualquer dia a tia Esperança morre e vou ficar ainda mais despido, vou prolongar os meus silêncios e fico por aqui com os horários dos pássaros, com a porta da cozinha, com a sala que anoitece comigo lá dentro. E embora tudo isto pareça estupidamente vazio de sentido, algo doloroso, ou mesmo triste não há razão nenhuma para desesperar. Afinal a coisa que respira ou que é respirada fez o caminho todo, parou em várias estações, tropeçou, levantou-se, riu e chorou e voltou à estrada. Um dia destes a outra há-de aparecer. Não me abordará directamente, não me virá bater à porta da cozinha até porque ela já mal consegue fechar. Ficará dentro do carro ao fundo da rua sem pressa até eu estar pronto. Atravessará a rua para ir até à esplanada beber um café enquanto eu faço a mala. Depois, quando estiver pronto saio de casa, deixo aberta a porta da cozinha e entro no carro com ela. Pelo caminho há-de me estender dois ou três manuais de instruções para melhor me ambientar na minha nova dimensão. É capaz de me dizer que era tudo um enorme barrete que me enfiaram enquanto avaliavam se estava com atenção. Uma ilusão, uma piada de muito mau gosto a ver se tinha sentido de humor. Nessa altura vou tentar olhar para trás e rever o telhado da garagem onde entram e saem os pássaros, a porta da cozinha, a sala que anoitece em silêncio, a casa que encolhe na distância e no tempo. Hei-de os voltar a ver a todos mais uma vez e quando acenar a dizer adeus vão perceber que os amei profundamente.
Artur
segunda-feira, 11 de janeiro de 2021
AVESTRUZIA
Olha a pandemia, caem que nem tordos, olha o especialista muito sério e a esbanjar verdades na televisão, olha o político a apanhar bonés e a enfiá-los nas nossas cabeças.
Isto é tudo uma treta - diz o esclarecido - a mim não me enganam, foi tudo um ganda grupe que os chineses inventaram enquanto cozinhavam morcegos.
Já lá para dentro - diz a autoridade - ninguém sai até que alguém vos chame.
Então e o Natal? Então e quem é que me vai pagar a despesa dos balúrdios que fazia sem pagar impostos? Cheguem-se mas é à frente porque a economia não pode parar.
Vá podem saír por alguns dias, mas vejam lá como é que se portam. Mas ninguém se importa, todos querem chegar primeiro, à frente de tudo e de todos. Primeiro Eu e depois Eu e no fim ainda eu. Que se lixem as regras, estava só ali…são só cinco minutos… não quer dizer nada…
E os tordos voltam a adoecer, a encher as enfermarias, a cair do céu às centenas. E toca a andar tudo já para dentro outra vez. Ninguém sai, ninguém pia. E mais especialistas e mais donos da verdade e mais cientistas de formação instantânea e mais enterradores de bonés. E mais, Eu já tinha dito, está tudo mal feito, a culpa é daquele e do outro. E as avestruzes correm em todas as direcções, enterram a cabeça na areia pensando que ninguém as consegue ver. De cu para o ar e a brisa a entrar em vez de sair com contaminações na bagagem.
Olha a vacina liindaaaa! grita o vendedor de rua, Olha a bela vacina. E todos correm para lá. Olha a beeela vacina, onde é que está a vermelhinha, não estou aqui para enganar ninguém, olha o belo cobertor leva dois e poupa um pintor.
E a avestruz corre, corre desenfreada de nada e direcção enquanto o fogo alastra pelo campo todo e não lhe deixa espaço onde se esconder.
Olha a política, olha a economia, olha um mundo antigo inteiro que se recusa a queimar consumido pelas chamas, olha os mortos, olha o desnorte, a paranóia.
Olha a vermelhinha embrulhada no cobertor para a vacina mais colorida. Olha para aqui, olha para ali, olha para dentro de ti e procura, tenta encontrar. Estás morto dentro de tanto ruído, desorientado debaixo de tantos sinais de trânsito, estás perdido num amontoado caótico de um mundo em pedaços que insistem em ficar de pé. Não há chuva tão cedo antes de tudo arder. Não há rumo, não há doença nem cura. Só este ar estúpido de avestruz científica que ora corre para lado nenhum ora enterra a cabeça pensando que ninguém a consegue ver. E acabas em silêncio num quarto às escuras a falar sozinho de cu para o ar enquanto uma brisa passa pela janela fazendo questão de entrar trazendo consigo o elixir da vida a solução de vendedor de esquina e o arrepio da morte. Ou da sorte ou do caminho que continuará mas que te vai obrigar a reinventar, a ser outro animal se por acaso conseguires voltar a atravessar a savana queimada onde outra savana começará a nascer.
Sei lá…
Artur
sexta-feira, 8 de janeiro de 2021
AINDA NÃO...
O livro escolhe vários cantos da casa para se esconder nomeando duas ou três vozes que brincam comigo como em criança.
Ainda não……
E eu parto determinado a encontrar as suas palavras, o seu discurso, aquilo que têm para me contar. Depois junto tudo numa mesa de montagem improvisada que vai colando capítulos, aproveitando frases, seleccionando ideias para a frente e para trás até ficar o filme completo.
Ainda não…..
E por vezes paro a busca, fico a olhar para o Nada á minha frente, para o Nada que sou sem que um pensamento me visite. Um vazio estranho e prolongado que se senta ao meu lado e me obriga a ouvir o silêncio. Despojado de ideias, de direcção, despojado de vontade para continuar, as interrogações vão entrando á medida que aumenta a paralisia. Fico ali meio agitado meio desesperado até que o vazio volta a olhar para mim e me repete a instrução. Deixo voltar o silêncio que educadamente vai empurrando as interrogações uma a seguir à outra enquanto uma das vozes me indica que está pronta para começar o seu discurso.
Já pode…..
Então, como um miúdo que nunca deixei de ser volto entusiasmado e vou à procura. Neste momento escrevo sobre três mulheres, mãe e duas filhas.
Insisto em escrever porque é a única forma de continuar vivo, a profilaxia mental que me afasta do vazio e me ocupa as horas. Insisto em escrever porque julgo ser a única coisa que sei fazer bem. Em todas as outras dimensões da minha existência oscilei entre a incompetência e o amadorismo. Por isso gosto de contar histórias inventadas ou tiradas da realidade, gosto de ouvir as vozes que decidem falar comigo e tomar nota do que dizem. Dessa forma vou conseguindo fugir da morte, do vazio e da falta de sentido,
Ainda não…
Dessa forma vou ganhando tempo e vou conseguindo falar com outros como doentes na sala de espera do consultório. Contando-lhes histórias, distraindo-os, vou deixando que me distraiam a mim atrasando-se assim a hora da injecção ou do tratamento doloroso que ninguém quer mesmo sem saber do que se trata.
Ainda não…
E a senhora da recepção atrás de uns óculos e uma maquilhagem assustadores enquanto nos avalia e ao mesmo tempo deita o olho a uma lista de espera na secretária à sua frente.
Ainda não….
Duas irmãs e uma mãe cada uma perdida no seu universo pessoal que se amam e odeiam sem o conseguir dizer , três mulheres em três tempos diferentes que comunicam vagamente entre si. Escrevo aquilo que elas me quiserem contar, não vou inventar nada. Sigo pela casa fora a rebuscar os cantos e a guardá-los no saco até ter o embrulho de um romance. Depois será como um filho que atingiu a maioridade e segue o seu caminho
Ainda não…
Kurosawa não falava português mas também se lembrava de brincar às escondidas em criança. Por isso dizia "Madadayo" em vez de
Ainda não…
Por isso fez um filme com esse título entre uma série de obras primas. Longe de mim fazer comparações. Escrevo também porque percebi que há uma linguagem que todos falamos por mais distantes que possamos estar culturalmente. Todos brincámos ás escondidas em pequenos. E continuamos a brincar pelo resto da vida. Umas vezes descobrimos os outros, outras vezes deixamo-nos encontrar. Umas vezes ouvimos os outros, outras somos nós que temos alguma coisa para contar. Chama-se a isto a Linguagem Universal. A ferramenta que nos permite adivinhar os "segredos imortais que no fundo são iguais em todos nós". É essa ferramenta que tento usar quando ouço as vozes, quando busco os cantos de um romance, quando me torno num contador de histórias. Para que a espera possa ser um pouco mais lenta e menos dolorosa. A espera que terminará quando atingir o número razoável ou suficiente de histórias para contar aos outros. Para depois me poder virar para a senhora da recepção escondida atrás de uns óculos e uma maquilhagem assustadores…para que possa dizer convictamente…
Já pode……
Artur
quinta-feira, 7 de janeiro de 2021
NA FORMA MAIS ARCAICA DE ESTAR
quarta-feira, 6 de janeiro de 2021
MENINA PÔR DO SOL