terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

FINS DE SEMANA EM FAMÍLIA - ANOS 60


Eram doces os dias daquele puto afortunado, e ainda mais os fins-de-semana em família com os pais e com o casal idoso que tomava conta dele durante a semana, aproveitando assim de uma penada todos os que mais lhe importavam.

Almoços de domingo numa Sintra calma e tranquila da segunda metade dos anos sessenta, ainda não adulterada por atentados arquitectónicos, nem sobrepovoada. Um recanto pitoresco, reservado a uns quantos privilegiados pelo doce bafo das queijadas, dos travesseiros e das circunstâncias da vida.

Havia idas estivais à Praia das Maçãs no embalo mágico de um comboio que na linha iniciada em Sintra, se punha a correr em carris que seguiam sinuosamente lado a lado com os carros, e nalguns pontos atrevidamente atravessavam a estrada, rompendo por uma paisagem de encanto, enquanto o “carocha” do pai ficava a folgar no estacionamento.

Noutros domingos, era a travessia de um deserto de campo aberto e vegetação rasteira entre o Cacém e Paço de Arcos ou Carcavelos, recompensada pela chegada a praias plenas de ar a mar, algas frescas e pequenas poças por entre as rochas deixadas pela maré baixa, carregadas de brindes – conchas, pequenos peixes e caranguejos.

Podiam ser tardes passadas no jardim de Queluz onde no seu triciclo de motor eléctrico oferecido pelo padrinho, procurava percorrer todas as possibilidades dos percursos na terra batida, antes que as pilhas acabassem.

Havia cinema em tardes passadas a ver o único canal de televisão, e a aproveitar a reposição das “novidades” do Ribeirinho, de Leitão de Barros ou dos filmes do Sabu, Tarzan e companhia.

Ás vezes, menos frequentes, eram as viagens de meio dia de duração até chegar ás Caldas da Rainha onde visitava a família materna, ou ainda mais raras e homéricas até à “antípoda” aldeia da família paterna, perdida nas serras de Proença-a-Nova.

De vez em quando, lá calhavam visitas ao Jardim Zoológico de Lisboa. No entanto, muito estranhavam os pais quando ao perguntarem-lhe se preferia ir ver a bicharada ou os aviões, prontamente trocava uma tarde de macacada, leões e elefantes, por contemplações infindas a partir das colinas no topo sul da pista do aeroporto de Lisboa, dos aviões a chegar e a partir não sabia para onde.

Fascinado por aquelas partidas para o desconhecido, mas por onde iam os pássaros, teve ali uma centelha aos três anos, daquilo que o atrairia mais tarde como modo de vida.

Voar.


Hélder

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