segunda-feira, 22 de junho de 2020

UM FIM DE SEMANA ESTRANHO





Foi um fim de semana no mínimo estranho. Começou com o desaparecimento de um grande escritor de língua castelhana e continuou com o suicídio de um actor famoso, imagem simpática do nosso universo audiovisual. Por outro lado, grupos de jovens ignoraram por completo as regras preventivas de segurança para resistir à epidemia que atravessamos juntando-se em grandes grupos de convívio nocturno enquanto o primeiro médico infectado morria vítima do vírus. Seguiram-se as frases feitas para este tipo de ocasiões, os comentários elogiosos, as reflexões, perplexidades e todo o restante  folclore emocional que desperta em momentos como este. Momentos de fim absoluto, de morte, momentos onde tudo parece recolocar em perspectiva o sentido da existência. Doença terminal, suicídio, inconsciência, morte em trabalho.
Um escritor de sucesso inquestionável abriu-nos janelas sobre mundos imaginados que nos fizeram sonhar e, acima de tudo, histórias que nos fizeram companhia em horas de solidão. Um actor de sucesso, pai de família, atlético, bem parecido, que tinha aparentemente tudo para ser um homem realizado não resistiu ao desgaste da depressão. Um profissional de saúde infectou-se no decurso da execução do seu trabalho e acabou por morrer ao fim de vários dias em luta contra o vírus. Jovens de várias partes do país ignoraram o perigo do contágio e reuniram-se de forma indisciplinada e desorganizada em festas convívio despertando novos focos de contaminação e abrindo linhas de contágio por razões perfeitamente pueris.
Se para alguma coisa servirá a morte dos outros será para nos lembrar a nossa própria morte. Que não estaremos cá para sempre e que o sentido e a explicação que buscamos da razão de aqui andar nunca serão encontrados. E isso só por si seria razão suficiente para sermos menos egoístas, menos gananciosos, menos filhos da puta uns com os outros. Só que não. Estas mortes vão passar e daqui a umas semanas já ninguém se lembra do que aconteceu a não ser aqueles que sentiram mais de perto a partida dos outros. Recalibrada a perspectiva, realinhada a precariedade da existência, relembrados da nossa curta passagem por estas bandas, tudo voltará à imbecil normalidade.
Parece que a Vida, ou o Universo, ou a nossa própria condição humana quis dizer-nos qualquer coisa, dar-nos uma espécie de recado. Só não percebemos qual, exactamente. Ou se calhar percebemos…pelo menos uma ou outra parte, o que já não seria mau.

Artur

2 comentários:

J.Young disse...

Palavras sábias, Artur. As lições que não vamos aprendendo. Os RIP e os DEP duram pouco mais de uma semanaç

Artur Guilherme Carvalho disse...

Thanks mate.