terça-feira, 9 de outubro de 2012

E DEPOIS?


É tarde, muito tarde. Na noite que avança, na existência cansada, no limite da paciência, é tarde de uma maneira geral. Todos os cantos deste quarto anónimo no cu do mundo destilam um cheiro a fim. Não há garrafa de whisky que chegue nem comprimidos que tranquilizem, que tornem este vazio imenso numa sensação mais agradável, mais fácil de suportar. Não há culpas escondidas em lado nenhum com o nome de ninguém, apenas cansaço. Um enorme, um insuportável cansaço de tudo em geral. Um virar de página em forma de vertigem, um sinal partilhado pela mente e pelo corpo que dizem que foram atingidos os limites. Daqui para a frente será outra coisa, nascerá um caminho sem rumo, uma existência fora da existência, uma coisa qualquer que poderá ser o nada. E depois?

É tarde, muito tarde para conseguir chorar, para arrependimentos, rancores, ódios de estimação, exibições desnecessárias. É o tempo das paisagens desérticas onde nada existe, onde nada faz sentido porque se perdeu o fio que segurava a minha fotografia na galeria da esperança. Quebrou-se a moldura onde me encontrava comigo. O esquecimento da consciência do Ser por afogamento na rotina dos dias todos iguais em direcção a lado nenhum. O cansaço do vazio, a impossibilidade de escrever o nosso nome até ao fim, a impossibilidade de reconhecer aqueles que nos importam, que nos importaram…Nada, apenas cansaço enrolado em torno de anéis de fumo que se dissipam tão rápidos como se formam, tal e qual as recordações, emoções, os tropeções e os estremecimentos do Ser, supostamente lições para ensinar qualquer coisa que já não apetece aprender.

Cansaço, um enorme cansaço vestido com as roupas da indiferença e da neutralidade de quem observa de fora, de quem vê de longe mas que já não estica o braço para agarrar.

Tudo termina e há momentos de fim que são aguardados com expectativa, como se já não houvesse espaço para esperar mais nada.

Nunca percebi grande coisa sobre a vida e, o pouco que consegui perceber, chegou sempre numa altura em que esse conhecimento já não me servia para nada. Tudo é ausente de explicação, de racionalidade, tudo tem uma função inexpugnável ao entendimento.

Um bafo metálico sopra-me canções de arrepiar aos pelos da nuca, demora-se, explica-me que veio ao meu encontro porque o chamei. Porque achei que o meu massacre também deveria acabar. Não podemos ser exterminados pela dor em modo infinito.

Tudo termina, tudo tem que ter um fim. E ainda bem…



Artur

2 comentários:

Clarice disse...

O fluir das palavras a fazerem sentido mora na minha grande paixão de ler...

Artur Guilherme Carvalho disse...

E não pode ser de outra maneira...