segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

TRÊS OLHARES SOBRE UM DIA


ALGURES ENTRE O MUNDO E NOVA YORK

Na minha opinião toda a gente devia ir a Nova York pelo menos uma vez na vida. Por várias razões, que se prendem com um espectáculo único de sons, cheiros, cores e cenários urbanos. Trata-se, sem qualquer réstia de exagero, da capital do mundo, para onde sempre convergiram e continuam a convergir gentes de todos os cantos da terra em busca de uma vida melhor, de mais espaço, de mais qualidade. A consequência mais evidente espelha-se na riquíssima oferta gastronómica, cultural, turística, etc. Em Nova York as ruas e as avenidas têm números em vez de nomes, as primeiras cortam a cidade à largura enquanto que as outras a percorrem a todo o comprimento sendo fácil a orientação para um estrangeiro, em certas esquinas cheira por vezes a baunilha, sai um fumo constante das tampas dos esgotos (de Inverno ou de Verão), há quase tantos táxis a circular como prédios, o Sol joga connosco ao gato e ao rato por entre os espaços abertos dos arranha-céus e as pessoas são na sua generalidade simpáticas e disponíveis.
Por outro lado, estreitando um pouco mais a abrangência deste crónica, a cidade de Nova York é um paraíso para todos os amantes de cinema e literatura. Para esses, percorrer as suas ruas e avenidas é o mesmo que protagonizar um filme em sessão contínua ou um romance urbano repleto de mistérios e interrogações.
Um dia inteiro em passeio por este extraordinário cenário foi o que decidi fazer junto com o João e o Zé, aproveitando uma das boas prerrogativas que a vida de tripulante nos oferece. O frio acalmava em relação aos 9 graus negativos registados na noite anterior, ajudado por um Sol tímido de Inverno quando saltámos do comboio. Direcção Norte, Uptown, a caminho de Central Park, via 5ª Avenida. Picardias e galhofa constantes para atrasar os efeitos do frio, conversas ocasionais sobre os livros, temas a serem excluídos pelo mais velho. Não se podia falar sobre merda nem sobre a morte, temas quanto a mim extremamente ricos e parecidos em quase tudo. Antes de atravessarmos Midtown uma pausa para uma “bucha” num pronto a comer com 500 mil opções desde sandes a sushi, passando por vários pratos. Escolher, receber, sentar e comer. Não se perde tempo na cidade que nunca dorme. Os restaurantes estão sempre abertos e pode-se comer uma refeição a qualquer hora. Mastigação ao lado de uma família de turistas alemães, mesas repartidas que o espaço é pequeno, partilha natural de mesas. A inevitável conversa de circunstância, eram de Berlim, outra boa terra. Nunca lá fui, tenho uma ideia através dos filmes do Fassbinder, mas só isso. Dizem que mudou muito de lá para cá. Tem que ir lá um dia, é uma cidade muito bonita. Acredito. Despedidas com votos de boa estadia. Próxima paragem, (ou será passagem?), Biblioteca da cidade, exposição, efeméride sobre Jack Kerouac, poster enorme sobre a entrada. Então Jack, ganda maluco? Jack acena com uma garrafa de whisky na mão, estilo: não me digam nada que já estou a ficar farto da comemoração. Daqui a pouco vou até Central Station e meto-me no primeiro comboio para o Sul. Fuck este frio. Avenida acima, paragem obrigatória no Rockfeller Center. Fotografias e mais galhofa, bocas a voar em todas as direcções…o Jan acha que fica com o cabelo parecido com o do Paulo Bento, não gosta de ser enquadrado abaixo da linha do peito (manias). Árvore de Natal ao fundo, pista de gelo mesmo na base do edifício. Gente, muita gente em todas as direcções. Estação seguinte: paragem obrigatória na Barnes & Noble, espaço nobre de editores, autores e leitores. Uns livros para o saco, ON THE ROAD para o João, que ainda não tinha lido. A revista inevitável às longas prateleiras de títulos com particular atenção aos autores norte-americanos, muitos habitantes desta magnífica cidade. E é já com uns saquinhos na mão que o trio ataca Central Park. Mais uma sessão de fotografias, mais bocas, mais galhofa. O lago quase gelado com algumas placas à superfície. Pausa para enquadrar. O Paul Auster morou ali, do lado esquerdo, e o Lennon morava mais acima na parte norte do Park. O Salinger deambulou por estas ruas em adolescente, antes de escrever o clássico Catcher in The Rye. Referências…Circunda-se o Parque e pés ao caminho para baixo, apanhar o Metro perto da Broadway. Uma nuvem de néon ilumina as ruas como se fosse dia. Os espectáculos, a publicidade, os filmes em ecran gigante. Uma visita breve a uma loja de fotografias de cartazes de filmes e capas de discos. Um (re)encontro com vários filmes antigos. Destaque especial para o MANHATHAN de Woody Allen, outro rapaz desta aldeia. O banco no parque e a silhueta do casal. Belo…belo. Um atribulado debate sobre que transporte escolher para ir até lá abaixo. Uma entrada e saída no Metro. Uma reentrada no Metro e vamos embora. Saída na fronteira entre Greenwich Village e Little Italy, à procura de Washington Square. Queria mostrar duas livrarias ao João naquele espaço. Não encontrei nenhuma. Que se lixe…fica para a próxima. O Zé lembrou: aqui morou durante muitos anos o Dustin Hoffman. Era normal encontrá-lo à tarde a jogar xadrez no jardim da praça. O COWBOY DA MEIA NOITE salta-me de imediato da prateleira da memória. Outra história extraordinária tendo Nova York por cenário, John Voight, um clássico dos anos 70, um dos mais belos filmes que vi, um papelão de Dustin na personagem de Ratzso. Antes do restaurante houve ainda tempo para parar à porta do mítico Café Wha e tirar as fotografias da praxe. Finalmente o Sri Lanka, lugar único em sítio único. Luzes e enfeites de Natal pendurados da parede em quantidades gigantescas. Espaço mínimo para poucas pessoas. Na porta ao lado, o Bangla Desh, no mesmo género. Jantarada animada, planos para o futuro, o próximo livro de cada um, as dificuldades para editar, a tertúlia que se avizinha daqui a uma semana.Faz de conta que o jan faz anos, conversa de bastidores com o bacano da cozinha e a cantoria dos parabéns em srilankês. O alvo da bricadeira até bateu palmas em frente ao gelado com uma velinha acesa. Ouvir os parabéns em srilankês não é para todos nem muito menos todos os dias. Canseira, pés doridos, comboio e nem paciência para beber mais uma porque o caminho já estava pesado. Um dia divertido e descontraído na cidade mais extraordinária do mundo, com dois amigos.
ARTUR

9 comentários:

Anónimo disse...

"Os restaurantes estão sempre abertos até à hora do fecho e pode-se sempre comer uma refeição a qualquer hora."
Passei e li. Adoro NY e adorei a sua descrição da mesma, só não adorei esta frase. Tire-a, shiuuu eu não digo a ninguém.

redjan disse...

Art: Escrita assim, lida sentado com um café na mão, a descrição daquele dia torna-o em algo que existiu duas vezes... tantas quantos os amigos com quem pude viver um dia ao sol na cidade cujo encanto reside na capacidade de cada um lê-la, tê-la, mirá-la, fazer dela sua ...
Thanks for beeing there Chaval, pelas fotos e tiradas anormais em todo um passeio a três !

PS: o anónimo deve ter boas intenções mas peca por falta de profundidade .... os restaurantes estão mesmo abertos até à hora do fecho, o que significa que um minuto antes de tal, podemos entrar e usufruir ... e pode-se sempre comer uma refeição a qualquer hora sim ... se não num lado , noutro ... daqueles que .... só fecham à hora do fecho...

Great text pal .... as usual !!

Carlos Lopes disse...

Deve ter sido do melhor!!! Eu aqui em Carcavelos e vocês "between the moon and New York city", como diz a canção...

Artur Guilherme Carvalho disse...

Anónimo: Concordo consigo. a frase também me soa mal. Vou emendar. Obrigado, volte sempre.
Red: É assim xaval. Toca a coleccionar estes dias para mais tarde recordar.
CL: Se não apareceres na tertúlia acho que te vou cagar à porta. 1 Abraço
ARTUR

Anónimo disse...

Valeu Artur, acho que fui um pouco duro no meu comentário, se fosse meu amigo teria-lhe ligado e não teria comentado, é mesmo um texto magnifico. Fui a NY há 2 anos com a minha mulher e os meus sogros. A sua descrição é notável, parece saída de um livro. Não o conheço mas deixo-lhe um abraço.
Paulo
Redjan, percebi o sentido da frase depois de a explicar. É outra interpretação que eu poderia ter dado e não dei. Artur, tem aqui um amigo!

Anónimo disse...

Artur,
Fantástico post!
Grande Abraço,
Bi

Anónimo disse...

Já agora, faltam-te os links para os amigos Zé e João.
Big Abraço,
Bi

P.S.: Os outros dois post`s estão do caraças, mas do caraças mesmo!
Ambos são brilhantes e envolventes, mas o teu texto é do camandro, para não dizer do cacete...
Grande Abraço,
Bi

Artur Guilherme Carvalho disse...

Bi: obrigado pelas palavras. é sempre bem vindo de aparecer e deixar opiniões. Um abraço
ARTUR

Hélder disse...

E mais de doze anos passados, leio deleitado e com uma ponta de inveja branca por não ter testemunhado este dia de três estarolas, passado no umbigo do mundo.
E que belíssimo tributo ao que partiu.
Não tinha lido ainda este teu texto.
Obrigado, Artur.