quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

SOLIDÃO

 



Não há nada mais poético e mais solitário do que uma estação de comboios num dia feriado ou num Domingo. Sem pessoas nem máquinas a decorar a paisagem restam apenas as estruturas, a imensidão do apeadeiro, um banco ou dois, os carris sem nada para fazer. E, no entanto, todo esse vazio que o nosso andar vagaroso experimenta revela-se numa imensidão de sentidos, informações, mensagens tranquilas escritas pela caneta da ausência. Uma partida madrugadora depois de um adeus forçado, o frio a pedir uma sala aquecida pela lareira, um grito desesperado de fechar definitivamente as contas com a vida e partir para outro destino, reencontros, corridas apressadas para esperanças prestes a partir. Não há nada mais poético nem mais digno do que a espera em solidão pelas respostas que a ausência interroga. Sozinhos na plataforma, assim nascemos e morremos percebendo exactamente a mesma coisa no fim do que percebíamos no princípio. Nada. Aparte isso, viagens e mais viagens, multidões apressadas de sensações, ruídos estridentes de expectativas, avisos sonoros sobre a nossa cabeça, agitação, confusão e caos. Por isso a estação vazia e o regresso à calma de sermos aquilo que sempre fomos amparados pelo braço do silêncio.

Não há nada mais digno nem mais confortável do que não ter ninguém à nossa volta a não ser os nossos pensamentos, o diálogo interior sem nada que o consiga interromper. O mundo de onde nunca deveríamos ter saído assombrados pela ideia de que nunca lá poderíamos voltar. As voltas e voltas à procura de uma explicação, de um sentido, uma razão por mínima que seja para conseguir compreender o que se passa.

Não há nada mais confortável nem mais profícuo do que alguns momentos de solidão para conseguir ver com muito mais lucidez tudo aquilo que a algazarra dos dias, a multidão e o frenesim para lado nenhum não permitem.

Numa plataforma isolada a única coisa que faz sentido é a própria forma das coisas. Descansada, silenciosa, embrulhada na razão do seu próprio ser. E a mochila pousada ao lado das botas cansadas em intervalo de caminhadas. Cheira-se o vento em busca de uma direcção, afina-se o tempo ouvindo os sinais do corpo, acende-se um cigarro lento enquanto as palavras se vão arrumando à volta daquilo que se pensa. No fim outra coisa surgirá. Outra direcção, outra viagem, outro caminho dará início ao desenho dos próximos dias.

Não há nada mais poético nem mais estimulante do que um homem sozinho numa plataforma sem gente, a interrogar o destino com um cigarro lento nas mãos. A escolher entre o passado e o futuro, entre a vida e a morte. E à sua volta o tempo fica parado à espera de uma decisão, o frio cala-se por instantes e o mundo vai lá fora enquanto nada acontece. Amanhã tudo voltará a acontecer…de uma maneira ou de outra. Amanhã o homem voltará a ouvir o seu nome pronunciado pelo vento nas folhas das árvores. E será ele outra vez.

 

Artur


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