sábado, 16 de novembro de 2013

DIAS DE NADA, NOITES DE COISA NENHUMA

Vai acontecendo a uma frequência cada vez maior. Aqueles dias em que chego ao fim sem nada ter feito, um escoar de tempo como areia pelos dedos fora. Não tive nenhuma vontade digna desse conceito, não fiz nada e, melhor ainda, não tenho a mínima preocupação, o mínimo remorso com isso. Instalo-me no vazio como numa acolhedora habitação onde nada “é” para além de si mesmo, onde nada existe para além da sua exclusiva existência…incluindo eu. Nascemos já culpados e condenados por religiões e teorias políticas, crescemos a correr sem parar contra o tempo, a frustração e principalmente, contra o outro. De alguma forma, por mais que seja o nosso esforço, por mais que nos estafemos e nos empenhemos às vezes correndo o risco de desaparecer nesse empenho…nunca chega, nunca é suficiente. Há sempre mais qualquer coisa que é preciso fazer, mais qualquer obstáculo que falta saltar, mais um contributo para dar. E tudo isto acaba por esbarrar na racionalidade, na vantagem, no “porquê” de uma vida inteira esbanjada no esforço e na despesa. E tudo apenas para estarmos vivos, para continuarmos vivos, para ter o simples direito a viver. Quantos seres vivos que habitam este planeta é que pagam o tributo de existir? E esse tributo que nos obrigam a pagar vai para onde, para quem? Serve para quê, afinal a puta de vida, isto é, aquela que nos obrigam a viver? Gosto desses dias em que nada acontece, em que nada fiz e em que não me sinto minimamente preocupado por isso. Nesses dias as noites passam-se num sono inteiro e tranquilo. Não acordo uma única vez, os sonhos são pacíficos, repletos de harmonia. Nesses dias o tempo não me envelhece, não me enerva, não me cria estados de ansiedade, não tem qualquer influência sobre mim. Fico no vácuo da existência só tendo espaço para contemplar as árvores, o voo dos pássaros, a dança das nuvens, a plenitude do mar. Espectáculos onde basta ter olhos para poder assistir. Onde ninguém vende bilhetes á entrada, ninguém distribui culpas à saída, ninguém inventa dívidas de espécie nenhuma. E são esses “dias de nada”, essas “noites de coisa nenhuma” que me mantêm vivo, que me impedem de morrer prematuramente sufocado em dívidas que não contraí, em obrigações que não inventei, em contratos que tenho de cumprir apesar de nunca os ter assinado. Nesses instantes raros em que percebo o cosmos e ele me percebe a mim enquanto seu filho, enquanto parte dele, nesses instantes, não sendo nada sou Eu inteiramente. Por isso cada vez mais procuro esses dias em que nada acontece, a minha vontade se desliga e o arrependimento se extingue. Artur

2 comentários:

Hélder disse...

Idem!
Quando se pode, deve-se preguiçar. Só assim "a pele" se renova sem rugas.
Como eu te percebo! ahahaha

Artur Guilherme Carvalho disse...

És grande Hélder. já tás é a dever material aqui ao blog há algum tempo. tamos á espera. senão amanhã vou buscar a Cicciolina dos bons tempos a ver se temos audiência. Abr