sábado, 31 de maio de 2014

DESPERTAR DE COISA NENHUMA



É sempre agradável acordar para encontrar um dia de Sol resplandecente recebido por um bafo quente típico mediterrânico. A árvore da rua quieta e exultante de verde, o melro habitual aos saltos entre os seus ramos, o vizinho asiático em movimentos de harmonia no terraço, e lá em baixo o rio, azul e dourado de milhares de reflexos, quase que conseguimos ouvir o rumor silencioso de um casco a deslizar sobre a água empurrado pelo vento. É sempre agradável, mesmo sabendo que não é verdade, julgar que tudo está no seu lugar, não há pressas nem pressões, as novidades tristes não se levantaram hoje, nada existe digno de perturbar esta paz. Acordar com a saudação do teu beijo e a informação que não há nada de novo a assinalar deste lado do império, deste lado da cidade, deste lado da existência. E nesse instante é tempo de espreguiçar, inspirar este ar até ao limite e simplesmente estar. Descer a rua, comprar o jornal e passear pela banalidade de não ser nada além de uma peça mais nesta manhã de Sol resplandecente embrulhada num tímido bafo mediterrânico. Dançar a harmonia da ginástica do vizinho asiático, acenar ao melro da rua, cruzar o rio em silêncio a caminho da barra.
Fazem falta estas manhãs em que não acontece nada para ganhar embalo para o resto dos dias que se seguem. Faz falta acordar com o teu beijo antes de ligar a máquina do café, faz falta ver o mundo parado por umas horas e pensar, mesmo não sendo verdade, que tudo está exactamente onde devia estar. Manhãs em que não é preciso provar nada, demonstrar nada, fazer nada…apenas estar e fazer parte do cenário despreocupado, sereno, em paz.


Artur

sexta-feira, 30 de maio de 2014

JOÃO RAIO DE CARVALHO



Não vou chorar, nem lamentar nem muito menos enaltecer as tuas qualidades e a admiração que sempre tive por ti. Em vez disso vou encarar os factos olhos nos olhos, com frontalidade e sem mariquices como sempre te vi a ti fazer em relação à vida em geral. Vou antes recordar as longas conversas, o clube e o signo em comum (até o último apelido), os” baldes” bebidos em franca cumplicidade, a afectividade mutua, a improvável amizade entre duas gerações tão diferentes com passados tão distintos. Vou recordar sempre a tua espinha direita, de antes quebrar que torcer, a tua obsessiva atitude de “não alinhado”, o teu desprezo pela mediocridade. Entre nós a Liberdade e a Dignidade foram duas mulheres que sempre habitaram as nossas vidas embora amadas de maneiras diferentes. E assim aceitámos, respeitando as diferenças de cada um. Não vou lamentar nem sequer queixar-me da sorte que assiste a todos os seres vivos porque sei perfeitamente que me olharias com esses dois faróis azuis e, sem nada dizer, me lembrarias essa arrogância que é sempre necessária, essa atitude, essa última fronteira digna que é ser esmagado pela vida sem desistir. Como tu que a meio de um enfarte, à espera da ambulância, resolveste sentar-te num banquinho e acender um cigarro. Como tu, que fugias pelos corredores de um hospital qualquer a empurrar o carrinho do soro com uma bata vestida de rabo ao léu, cigarrinho na mão a trotar à frente de um enfermeiro diligente. Como tu que me contaste uma vez que durante um período da tua infância a imagem que tinhas do teu pai era composta por um sofá, umas pernas debaixo de um jornal aberto e uma coluna de fumo a sair desse enquadramento. Espero um dia conseguir aproveitar alguns destes teus episódios para histórias minhas. Espero, aliás, tenho a certeza, que as nossas conversas serão retomadas um dia, o nosso clube, os nossos “baldes”, as nossas gargalhadas. Por isso não lamento nada porque não há nada para lamentar. Olho para a morte como te vi olhar, cagando para ela. Olho para a ordem natural das coisas como te vi sempre olhar, sem medo, arrogante, desafiador, LIVRE.  Olho para tudo em geral e relembro o teu exemplo de ser humano excepcional que passou por aqui e que deixou a sua marca, um guerreiro que nunca se rendeu. Um grande abraço para ti meu amigo. Nunca te esquecerei. Um dia destes a gente vê-se. Viva o Sporting…


Artur


quarta-feira, 28 de maio de 2014

O TEMPO SEM MORADA NENHUMA


Sempre julguei que os indivíduos desapareciam antes das suas memórias. Mais uma vez estava enganado. No meu caso, ou melhor, no caso da minha geração que nunca foi exemplo para coisa nenhuma, tudo se tem vindo a passar precisamente ao contrário. Referências urbanas, ideológicas, estéticas ou simplesmente recreativas vão sucumbindo umas atrás das outras a um ponto que começo a ter dificuldades em perceber se alguma vez tive um passado, se cheguei a existir realmente. Não bastou ter morrido tanta gente da minha idade nos anos loucos da juventude, não bastou termos atravessado o tempo embrulhados num manto de silêncio e indiferença pelos ventos da História. Marcos urbanos vão caindo um após outro deixando-nos isolados, cada vez mais sozinhos, cada vez mais inexistentes. A escola provisória de Algés onde fizemos o 12º ano, o cinema Europa das matinés infantis, o pavilhão dos concertos em Cascais, o café das primeiras paixões, o bar da juventude e das intermitências da idade adulta. Tudo fecha ou é demolido para dar lugar a condomínios anónimos, tudo desaparece encurtando o espaço de recordar. Temo mesmo ser abordado em breve por um jovem cientista de I Pad em punho que me fará um breve questionário que começará pela pergunta se fui jovem nos idos de 80 do século passado. No fim colocar-me-á uma etiqueta no pé, indicando-me a direcção de um museu qualquer. Lá serei recebido por uma  outra jovem que me olhará inicialmente com um ar desconfiado e me dará um frasco de formol antes de me indicar para que armário e em que prateleira me hei-de colocar. Cá fora uma placa explicará aos visitantes a minha espécie, idade, para que o futuro tenha uma referência cronológica de uma geração que ninguém percebeu que andou por aqui. Ficarei na Ala dos Vencidos e Indiferentes dois armários depois dos veteranos da I Guerra e dos prematuros mortos do Orfeu e da Liberdade perdida para o Estado Novo, mesmo ao lado dos desperdiçados pela repressão da ditadura, da Guerra Colonial e do vazio criado pela revolução entre dois regimes, pelos pioneiros das overdoses e dos veteranos que nunca mais encaixaram em lado nenhum.  Seremos ocasionalmente visitados por crianças ranhosas e adolescentes arrogantes que nos deitarão olhares breves de indiferença enquanto escarafuncham o nariz.
A Vida, a quem nunca demos muita importância por uma ou outra razão, o Mundo a quem sempre desprezámos, a sociedade a quem sempre recusámos vendermo-nos pagaram-nos na mesma moeda. Nada a dizer.  Não fomos os primeiros nem seremos os últimos a quem isso acontece. A geração dos nossos pais continua a tratar-nos por “putos” apesar de muitos já terem 50 anos. Nada do que fazemos os impressiona, um tratado académico é abordado como uma bonita redacção da escola primária. O mundo será o que sempre foi, uma quinta deles até que morram todos e, quando isso acontecer, haverá uma geração mais nova e mais bem preparada que nós para assumir a gestão desta exploração agrícola malcheirosa. Nós seremos apenas memórias sem memória, curiosidades museológicas com alguma experiência e conhecimento, breves referências de um tempo que se apagou a si próprio. Uma geração que nunca foi, uma juventude do silêncio, uma idade adulta da indiferença. Nunca cá estivemos mesmo quando brevemente julgámos estar em algum sítio. Porque esse sítio não existe e se transformou num condomínio anónimo, num parque de estacionamento, numa merda qualquer politicamente correcta. Tudo coisas que nunca quisemos ser.


Artur

segunda-feira, 19 de maio de 2014

UM COMBOIO PORQUE SIM



Ás vezes é difícil de ouvir porque o vento sopra em direcção contrária, porque um carro passa na rua ao mesmo tempo. Mas quando se encontra com os olhos fechados e os ouvidos quase adormecidos, quando os encontra naquele preciso instante a sua saudação é composta por palavras de uma profunda tranquilidade. No escuro, no espaço da solidão em que as lágrimas ocupam o recinto de baile e a banda toca melodias azuis, o apito anunciador e a passada certa, metálica, vêm mudar o disco. A linha é para continuar, a noite é para atravessar e não há outra maneira, não há outra solução. Nesse tempo em que o comboio atravessa a noite depois de se fazer anunciar há um ritmo, uma harmonia, qualquer coisa que embala, abraça e protege. Há um Charlie Brown empenhado em se declarar à menina de cabelo ruivo mas que não consegue sequer dizer-lhe bom dia, um Charlie Brown que confia cegamente na sua amiga que lhe retira sempre a bola no momento em que ele vai chutar, por mais que lhe prometa que não o faz. Há um cão filosófico e circunspecto que se deita no telhado da casota para pensar melhor. Há um homem empenhado em escrever no vazio da noite, desesperado pelas palavras que teimam em não chegar. E há um comboio normalmente no horário, que apita como quem cumprimenta, que atravessa o escuro num ritmo certo que embala, numa passagem que é um abraço.
Há um comboio que atravessa a noite como uma boa balada de Rock n’ Roll, um ritmo que avança, dá duas voltas, regressa e retoma a passada, uma melodia que vai crescendo, um som que preenche a escuridão.
Há uma noite para atravessar ausente de luz, um fato de medo e solidão para vestir, um chá de lágrimas salgadas para lamber, há uma travessia obrigatória na moratória da Liberdade. Um vale escuro e pedregoso através das terras do nada e da serra da derrota. Mas há uma linha, sabemos que existe porque ouvimos o comboio. Sabemos que há um caminho, uma direcção, que este tempo tem um fim. Porque sim.


Artur  

sábado, 10 de maio de 2014

PARA NOS RECORDARMOS QUE SOMOS HUMANOS



Esta extraordinária fotografia reporta-se a um momento de pausa nas filmagens de “La Strada” de Federico Fellini e conta a bonita idade de 60 anos. Nela podemos ver à direita Giulietta Massina, eterna companheira do realizador, descontraída a olhar para a câmara. À esquerda está um Anthony Quinn concentrado nas voltas daquilo que parece ser um pedaço de arame. Quando vi este filme pela primeira vez ainda não tinha vinte anos, e no fim, senti que tinha tirado uma licenciatura em filosofia de vida, um mestrado em Cinema e um doutoramento em comportamento humano sem me levantar da cadeira.
Sobre “La Strada” podiam escrever-se centenas de artigos sem que se esgotassem os temas. Para começar, o diálogo eloquente e a oposição entre Neo- realismo e Surrealismo no Cinema era suficiente para ocupar horas de debate acerca da componente formal.
Ao reencontrar o grande Zampanó e a sua assistente Gesolmina sentados ao pé de um circo de lona remendada tudo volta a ser objecto de pasmo e ternura. Antes de mais, a história destes personagens é um profundo ensaio sobre a fragilidade. Dois saltimbancos pobres e limitados percorrem estradas e povoados de uma terra tão pobre como eles exibindo o seu número. Ela anuncia e ele quebra uma corrente de aço com a força da caixa torácica em troco de algumas moedas, de uma refeição. Ocasionalmente juntam-se a um circo. São almas frágeis, limitadas que percorrem a estrada mantendo assim uma esperança de continuar vivas. Seres como todos nós , feitos de medo e de esperança, que caminham sem destino, que montam o seu número para ganhar um pão, uma sopa.
Olhando para esta fotografia, a primeira novidade é a cor depois de um filme integralmente a preto e branco, uma história cinzenta e triste.
Num tempo em que nos afogam de informação e cada vez mais nos afastam do conhecimento vão criando monstros executantes que perdem mais tempo a acariciar máquinas do que a cumprimentar o seu semelhante, a dar-lhe a mão. Fora do conhecimento estamos fora do entendimento sobre os outros, sobre o mundo, sobre nós mesmos. Deixando de perceber quem somos transformamo-nos em máquinas incapazes de ler a mais elementar emoção, incapazes de reconhecer a sua natureza.
Zampanó e Gesulmina estão condenados embora continuem humanos. Sentem o medo, a esperança, o humor. Porque a sobrevivência lhes ocupa todas as horas do dia não têm tempo para luxos como as emoções. Só as sentem enquanto mais uma oportunidade perdida, algo que ficou lá para trás na voragem de sobreviver.
“La Strada” é este monumento sobre a fragilidade humana que muitos julgaram ser possível trocar por alguma segurança, por alguma dignidade, pela simples atitude de quem não esquece uma lição aprendida. Puro engano. Por alguma razão escondida na inutilidade dos segredos, o pior que a Humanidade tem para (se) oferecer é sempre aquilo que prevalece. A justiça e a dignidade humanas são caprichos, breves sopros apagados nas leis. Restam-nos os remorsos de Zampanó, a terna memória de Gesulmina, o génio de Fellini. Resta-nos esta fotografia tão familiar e ao mesmo tempo tão querida para um jovem adolescente que compreendeu demasiado cedo uma série de conceitos que não lhe serviram para nada.


Artur 


quinta-feira, 8 de maio de 2014

TITÃS



De acordo com a mitologia grega, os Titãs fazem parte de um grupo de divindades que enfrentaram Zeus e outros deuses olímpicos na subida ao poder. Numa leitura mais aprofundada, a “Titanomaquia” está directamente relacionada com os mitos em que uma geração de deuses confronta os dominantes. Filhos de Úrano e Gaia, o caminho dos Titãs é uma longa estrada de vitórias e derrotas no panorama dos deuses. Nenhum nome poderia estar mais adequado do que este para a história de uma das mais carismáticas bandas do Rock de sempre no Brasil. Inconformistas, desafiadores, rebeldes, talentosos, independentes, os Titãs conseguiram formar um pequeno Olimpo, um lugar nos céus da criatividade, uma casa imortal onde as individualidades entram apenas e só para servir o colectivo.
Tudo começa em São Paulo nos finais dos anos 70 no colégio Equipe onde a maioria se conhece. A partir de uma apresentação na Biblioteca Mário de Andrade em 1981 surgem as primeiras actuações em casas nocturnas com o nome inicial de “Titãs do Iê-Iê”. A primeira equipa é composta por Sérgio Britto, Arnaldo Antunes, Paulo Miklos, Marcelo Fromer, Nando Reis, Ciro Pessoa e Tony Bellotto. Mais tarde o baterista André Jung.E logo de início uma característica que irá marcar a originalidade da banda fica vincada. Trata-se da versatilidade de todos os seus elementos. Todos cantam, todos tocam guitarras ou outros instrumentos. No início apresentam-se com um visual extravagante, pontuado por maquilhagem, penteados estranhos e casacos e gravatas de bolinhas. Gravam o primeiro disco em 84 para a WEA. O nome oficial passa apenas a “Titãs” e sai Ciro Pessoa. O primeiro disco (“Titãs”) fica desde logo marcado pelos êxitos de “Sonífera Ilha”, “Toda Cor”, “Marvin” e “Go Back”. Ainda no ano de 1984 o baterista André Jung deixa a banda e é substituído por Charles Garvin. O segundo trabalho é produzido por Lulu Santos e tem o nome de “Televisão”. Nessa altura a banda revela-se um fenómeno muito mais virado para o palco e as actuações ao vivo do que para o estúdio. As vendas na rua são fracas apesar da adesão do público nos espectáculos. Em Novembro de 1985 a banda é abalada por uma ocorrência extremamente negativa. Tony Bellotto e Arnaldo Antunes são presos por posse e tráfico de heroína. Um acontecimento que veio abalar a popularidade da banda. De regresso ao estúdio a entrada de um novo produtor na equipa (Liminha) veio dar um novo alento e de certa forma refrescar a vida da banda. De facto, com esta nova aquisição a banda consegue transportar para as gravações o peso e a versatilidade daquilo que já havia mostrado em palco. Durante os próximos três discos a parceria Liminha/ Titãs vai ser o momento decisivo na história da banda.

CABEÇA DINOSSAURO / O QUÊ ? / JESUS NÃO TEM DENTES NO PAÍS DOS BANGUELAS
Considerado um dos seus melhores trabalhos, bem como um dos mais importantes da história de todo o Rock brasileiro, “Cabeça Dinossauro” sai no ano de 1986. Com um sonoridade mais agressiva de influência “punk”, está aberto o ataque directo e sem tréguas à hipocrisia da sociedade da altura. Os alvos são as principais instituições como “Estado Violência”, “Policia”, “Família” e “Igreja”. Letras agressivas debaixo de uma sonoridade dura levam “Cabeça Dinossauro” a ser banido nas rádios e nas televisões. Em contrapartida nos espectáculos a multidão é cada vez maior, sabe as músicas de cor, compra os discos na rua. Rapidamente os Titãs chegam ao primeiro Disco de Ouro. Rendendo-se à evidência do sucesso as rádios começam a tocar as faixas de “Cabeça Dinossauro”. Algumas preferem mesmo pagar multas para passar faixas como “Bichos Escrotos”. Com “Cabeça Dinossauro” os espectáculos aumentam e as portas da Comunicação Social abrem-se definitivamente, marcando aqui o momento decisivo na carreira da banda. A experimentação em palco de samplers e da música electrónica vão ser uma imagem da marca para o próximo trabalho, “O Quê?”. Aclamados por público, crítica, e ainda por nomes tão importantes como Caetano Veloso e Legião Urbana, os Titãs vão para estúdio em grande estilo. “Jesus não tem dentes no país dos banguelas” continua a utilização de samplers  e da bateria electrónica em temas como “Diversão”, “Corações e Mentes” ou “Comida”. Na linha do trabalho anterior sobressaem também “Lugar Nenhum”, “Nome aos Bois” e “Desordem”. Com estes três álbuns de parceria com o produtor Liminha os Titãs conquistam e reforçam o seu lugar no panteão das grandes bandas do Brasil.
Após algumas apresentações internacionais a banda gravou ao vivo uma selecção de musicas antigas e lançou “Go Back” em nova versão. A parceria com Liminha consolida-se em “Õ Blésq Blom” em Setembro de 89, sendo uma das produções de maior êxito até então. Nela se destacaram tema como “Miséria”, “Flores”, “O Pulso” e “32 Dentes”. Neste trabalho há a destacar a curiosidade de incluir a participação especial de um casal “repentista” (cantores de quadras ao desafio e improvisadas) de Pernambuco, Mauro e Quitéria, descobertos pela banda numa praia do Recife.

NOVOS CAMINHOS/ FRACASSOS/PAUSAS

Em 1991 “Tudo Ao Mesmo Tempo Agora” foi um choque mesmo para os mais indefectíveis da banda. Os Titãs sentem a falta do velho Rock N’ Roll. Interrompem a parceria com Liminha e decidem auto produzir-se.O regresso ao estilo roqueiro é levado ao extremo com guitarras distorcidas e letras bastante agressivas. O fracasso comercial foi a porta de saída de Arnaldo Antunes que passou para uma carreira a solo. Apesar de tudo a faixa “Será Que É isso que Eu Necessito” ganha o Vídeo Music Award da MTV. A banda não se deixa desanimar e em 1993 lança “Titanomaquia” uma continuação do trabalho anterior. Produzido por Jack Endino (Nirvana, Soundgarden, etc) mantinham-se a sonoridade pesada e as letras agressivas. Apesar de a Comunicação Social se ter mostrado mais receptiva as vendas continuaram baixas.
No fim da tournée de “Titanomaquia” a banda decide tirar um ano de férias para que cada um se possa dedicar aos seus projectos pessoais. Miklos e Nando Reis lançaram discos a solo, Tony Bellotto escreveu o seu primeiro livro, Marcelo Fromer produziu outros músicos e Charles Gavin foi para Londres fazer uma curso de produção.
Em 1995 os Titãs estão de regresso com “Domingo” num registo mais próximo do pop. Embora o som se mantenha pesado o conteúdo lírico é muito menos agressivo. Disco de Ouro desse ano, o álbum inclui pela primeira vez um tema que não tinha sido composto pela banda. Trata-se de “Eu não Aguento” da Banda Tiroteio. “Domingo” contou ainda com as participações especiais de nomes como Herbert Vianna, João Baronne, Andreas Kisser e Igor Cavalera.




GLÓRIA E TRAGÉDIA
Para comemorar os 15 anos de carreira os Titãs gravam no Teatro João Caetano no Rio de Janeiro um trabalho acústico para a MTV. Considerado o seu melhor de trabalho de toda a carreira (1,7 milhões de cópias vendidas) a banda vai-se apresentar com um grupo de cordas e outro de metais de suporte. Outra novidade foi o facto de o antigo produtor Liminha, aparecer integrado a tocar com a banda. Nada que não tivesse já ocorrido em ocasiões anteriores. O disco revisita temas antigos e apresenta vários inéditos como “Os Cegos da Castelo”, “Nem 5 Minutos Guardados”, “A Melhor Forma e “Não Vou Lutar”. São convidados dos Titãs para este trabalho nomes como Rita Lee, Marisa Monte, Jimmy Cliff, Fito Paez, Marina Lima e Arnaldo Antunes.
Tentando aproveitar o sucesso do acústico em 1998 editam “Volume Dois” onde apresentam novas versões de temas antigos misturados com temas inéditos. Apesar de uma crítica negativa em geral as vendas correm bem. “Volume Dois” recebe o Troféu Imprensa para o melhor conjunto musical daquele ano.
1999 apresenta o primeiro trabalho dos Titãs não autoral, onde a banda canta canções de outros compositores como Tim Maia, Roberto Carlos, Raul Seixas, ou bandas como “Legião Urbana” e “Ultraje a Rigor”. Acusados de ter embarcado numa cedência ao mercado, são arrasados pela crítica apesar de as vendas terem corrido bem.
Em 2001, dias antes de entrar em estúdio para novas gravações, o guitarrista Marcelo Fromer é atropelado por uma moto em São Paulo. Morre dois dias depois. Começam a correr rumores acerca do fim da banda.
Depois de muito reflectirem (afinal Fromer era o guitarrista principal da banda) os Titãs decidem continuar. “A Melhor Banda de Todos Os tempos da Ultima Semana” acaba por sair como tinha sido previsto antes da morte de Fromer. Novos sucessos como “O Mundo É Bão Sebastião”, “Epitáfio” e “Isso” marcam mais uma agenda frepleta de concertos, prémios e a continuação do êxito. Perturbado com a morte de Fromer e da ua amiga e cantora Cássia Eller, Nando Pais deixa a banda.


Em 2003 “Como Estão Vocês” seguiu na linha pop/rock anteror apesar de vender menos. Em 2005 é lançado o terceiro disco ao vivo “MTV Ao Vivo” para comemorar os 25 anos de carreira que se irá prolongar até 2007 com vários espectáculos conjuntos com os “Páralamas do Sucesso”. Em 2009 estreia o filme documental “A Vida Até Parece Uma Festa” acerca da banda.
Em 2009 Rick Bonadio produz para a Arsenal Music “Sacos de Plástico” com distribuição da Universal Music. A banda deixa para trás os músicos de apoio e fica reduzida a apenas cinco elementos. Um ano depois é a vez de sair Charles Garvin.
Em 2011 as Titãs voltam aos palcos no Rock In Rio tocando ao lado dos Páralamas e também dos Xutos e Pontapés.
Entre 2013 e 2014 tocaram alguns novos temas na tour “Titãs Inédito” Em Abril de 2014 anunciam um novo trabalho(“Nheengatu”) que será lançado em Maio do mesmo ano.
Como vimos, a marca “Titãs” conquistou há muito o seu lugar no meio dos deuses do Rock N’ Roll. A sua imagem ficará para sempre enquanto referência, lenda, magia e versatilidade de uma rara conjugação de muitos talentos.

Artur



RETRATOS ANÓNIMOS




                                                                (Sofia Vaz Pinto)
                                                    

Há formas estranhas que se revelam entre fronteiras de cores e andanças de luz. Há quadros de Dali que se desenham sozinhos para a objectiva instantânea e única. Momentos que nunca mais se vão repetir, como um segredo que a Natureza revela apenas uma vez. Quem estiver atento e a conseguir ouvir aquele segredo sussurrado num instante terá o prémio dessa beleza enorme e intraduzível. Há momentos únicos que desfilam a todo o tempo no palco da vida que, uma vez por outra se deixam revelar.

terça-feira, 6 de maio de 2014

PRINCIPEZINHOS




                                                             (Imagens de Sofia Vaz Pinto)

Éramos um bando de crianças que corria despreocupada pelas ruas sem se ralar com muita coisa. O tempo ia passando, a história tropeçava mas não queríamos saber. Éramos adolescentes arrogantes cheios de certezas para nos defendermos dos enigmas sem solução. Preferíamos amar a vida, amar o nosso crescimento, amar-nos uns aos outros de vez em quando. Esquivávamo-nos dos obstáculos com uma perícia felina e seguíamos em frente. Ouvíamos música porque esse era o único território onde alguma coisa, quase tudo, fazia sentido. Não queríamos nada a não ser quem éramos sem pensar muito, sem perder muito, sem sofrer muito. Corríamos para cima e para baixo os caminhos abertos como turistas que visitam uma duna gigante num deserto longínquo, admirados e contemplativos. Principezinhos de uma história universal, de um mundo específico cuja única regra era cativar. A vida estava fora desse planeta onde tudo fazia sentido, onde o sofrimento e a dor não conseguiam viver, onde era sempre fim da tarde. 
Éramos um bando de crianças e nunca quisemos ser outra coisa. Por isso hoje ao ouvir músicas com os nossos filhos, ao reprimi-los sem vontade nem convicção, ao tentar levar a sério uma existência que nada tem de razoável, não perdemos uma oportunidade para agarrar uma brincadeira, uma gargalhada despreocupada, uma emoção pura. A nossa maneira de cativar só não funcionou com a vida, mas deu resultado em tudo o resto. Éramos um bando de crianças alegres e desenfreadas e nunca quisemos ser outra coisa. Mesmo quando nos vestimos de adultos, mesmo quando carregamos responsabilidades, mesmo quando olhamos para a morte sem a conseguir perceber. Uns principezinhos que nunca abandonaram o seu pequeno planeta em que tudo faz sentido e onde a dor e o sofrimento não conseguiam entrar enquanto não aprendessem a cativar.


Artur

domingo, 4 de maio de 2014

PÁRALAMAS DO SUCESSO



De uma simples banda de Rock até uma instituição musical de referência, os “Paralamas do Sucesso” atravessaram três décadas de mais êxitos que fracassos fazendo no essencial uma extraordinária gestão de recursos que vão desde a sua publicação regular de originais até à eficaz utilização da multimédia. Tudo começa em Brasília no final dos anos 70. Herbert Vianna, filho de militar e Bi Ribeiro, filho de diplomata, conhecem-se desde crianças. Mais tarde, a frequentar o mesmo Colégio Militar decidem formar uma banda. Por obrigações estudantis estão parados entre 79 e 81, altura em que retomam a actividade. Entre o interior fluminense e a casa da avó de Bi em Copacabana no Rio de Janeiro acontecem os primeiros ensaios e as primeiras canções. Ao princípio tudo era muito ligeiro com entradas e saídas até que, a partir de 1982 com a entrada definitiva de João Baronne para a bateria tudo se torna mais sério. Com Herbert na guitarra e na voz e Bi no baixo compõem três temas que enviam para a Rádio Fluminense. Um deles, “Vital e a sua Moto” torna-se um êxito imediato. O sucesso foi tal que se abriram as portas para um grande espectáculo ao vivo. No Verão de 83 abrem o concerto de Lulu no Circo Voador e no mesmo ano assinam com a EMI gravando o álbum “Cinema Mudo”. Em 1984 alcançam a consagração com “O Passo de Lui” onde se destacam vários sucessos como “Óculos”, “Me Liga”, “Meu Erro”, “Romance Ideal” ou “Ska”. A aclamação da crítica garante-lhes a passagem para a primeira edição do Rock in Rio (85), sendo na altura considerada a melhor actuação de todo o festival.
No ano seguinte editam “Selvagem?” mas desta vez já sem apoio da crítica que dele faz uma apreciação bastante negativa. Neste trabalho fica marcada a fusão do rock com a MPB e o “tropicalismo africano” de Gilberto Gil, que é co-autor (“A Novidade”) e participante (“Alagados”) em dois temas. Apesar de bastante maltratados pela crítica, os Paralamas conseguem vender 700 mil discos e participar no Festival de Montreux de 1987. Nessa actuação aproveitam para editar o seu primeiro disco ao vivo, manobra que se repetirá ao longo da sua carreira. Segue-se uma tournée pela América Latina onde vão ganhando popularidade em países como o Chile, a Argentina ou a Venezuela.
No álbum seguinte, “Bora- Bora” cuja novidade é a introdução de uma secção de metais, a sonoridade da banda ganha novos horizontes. As canções misturam a temática de análise política e social com a introspecção individualizada. É o regresso aos tempos de “O Passo de Lui” em termos de sucesso. Segue-se “Big- Bang” (89) que mais não é do que a continuidade de “Bora-Bora”, tendo com “hits” músicas como “Perplexo” e “Lanterna dos Afogados”. A década de 80 termina com a colectânea “Arquivo”.
A década de 90 é na carreira dos Paralamas uma etapa de experimentação onde desde um destaque nos teclados (“Os Grãos”) e o trabalho demasiado elaborado nos arranjos (“Severino”), publicam dois álbuns condenados a fracassar.  Neste último os Paralamas contaram com a particcipação especial de Brian May (Queen) no tema “El Vampiro Bajo El Sol”). Apesar do fracasso nas vendas e da pouca aderência de público e crítica, o que é certo é que os espectáculos ao vivo estavam sempre cheios para receber os Paralamas. Mas a banda não se deixa desanimar e parte rapidamente para o contra ataque. Primeiro lançam “Paralamas” (92), colectânea de versões em espanhol, para de seguida editarem “Dos Margaritas”, versão hispânica de “Severino”. Pela América Latina rapidamente alcançam os tops de vendas com destaque particular para a Argentina. Uma série de três espectáculos gravados no fim de 1994 transforma-se no ano seguinte no disco ao vivo “Vamo Batê Lata”, com quatro inéditos e o sucesso “Uma Brasileira” (parceria de Herbert com Carlinhos Brown e participação de Djavan),  “Saber Amar” e  “Luís Inácio”, esta uma crítica directa à política brasileira e aos “anões do orçamento”. O regresso ao formato pop, bem como a recuperação de temas de mais fácil leitura recuperaram a atenção de público e crítica. A estrada do sucesso vai continuar com “Nove Luas” (96) e “Hey, Na, Na” (98). Em 1999 gravam um acústico para a MTV Brasil que vende cerca de 500 mil cópias mais o Grammy Latino para o melhor disco do ano. Em 2000 sai a segunda colectânea (“Arquivo II”) com músicas de todos os álbuns de 91 a 98.
Ao contrário da década de 90, o início deste século foi bastante problemático para os Paralamas. Em Fevereiro de 2001, na sequência da queda de um ultraleve Herbert fica paraplégico e a sua mulher perde a vida. Tudo ficará em suspenso por uns tempos até Herbert recuperar. Percebendo que consegue continuar a tocar, a banda retoma os ensaios e avança com um conjunto de canções que já estavam preparado antes do acidente. 2002 é o ano de “Longo Caminho” e caracteriza-se pelo abandono da secção de metais. Num regresso às origens o som é agora muito mais limpo, duro, intimista. Seguem-se os espectáculos esgotados como sempre. As vendas chegam aos 300 mil exemplares. Além de um som muito mais pesado velhos temas como “Meu Erro” ganham novos arranjos. Os metais vão regressar em 2005 em “Hoje” se bem que o registo pesado se mantenha.
Em 2008 para comemorar os 25 anos de carreira juntam-se com os Titãs, também há 25 anos na estrada, para uma série de espectáculos. Série que vai terminar em Maria da Glória, Rio de Janeiro num espectáculo memorável lançado em CD e DVD intitulado “Paralamas e Titãs: Juntos e ao Vivo”
Em 2009 lançam “Brasil Afora” com participações de Carlinhos Brown e Zé Ramalho.
Em 2010 gravam o CD/DVD “Multishow Ao Vivo Brasil Afora” no Espaço Tom Jobim no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

Em 2013 voltam à estrada pelo Brasil fora, comemorando 30 anos de carreira.
A história dos Páralamas é uma estrada longa e bem sucedida que transformou a banda (tal como dizíamos no início deste artigo) numa instituição de referência no panorama musical tanto do Brasil como da América Latina.  O segredo do seu êxito talvez se prenda com coisas bastante simples. Com uma personalidade bem vincada, sem se intimidarem com as críticas e evitando ao máximo cedências comerciais, os Páralamas respeitam-se, respeitando o seu público. Hoje são aplaudidos por várias gerações, algumas que nem existiam quando tudo começou. Têm também um sexto sentido de adaptação extremamente apurado que lhes permitiu gerir uma brilhante carreira. Uma banda de referência, pois.

Artur



                 
   

sábado, 3 de maio de 2014

O B ROCK

                                                               (O Circo Voador)

Apesar de algumas intenções de abertura política poderem ser encontradas no discurso do Presidente Geisel, no início da década de 80 o Brasil vive ainda debaixo de uma ditadura militar. Nos anos que se vão seguir, um movimento generalizado da sociedade civil vai ganhando força, nomeadamente na pressão exercida pelo movimento “Directas Já” que exigia na rua a convocação de eleições livres. A materialização do fim da ditadura no entanto só acontece em 1988 com a promulgação da nova Constituição. Considerada pelos economistas como uma “década perdida”, pontuada pela estagnação económica e por uma inflação descontrolada, do ponto de vista social e político os anos 80 marcam um momento histórico único de rupturas e reconstrução.
Marcado pelo charme da bossa nova dos anos 60 e pela intensidade política dos anos 70 (MPB,  Tropicália) o Brasil abre uma nova direcção na sua criação musical. Se até então o Rock era um estilo de música presente no quotidiano brasileiro desde os anos 50, é na década de 80 que ele vai atingir a sua maturidade tornando-se pela primeira vez um verdadeiro fenómeno de massas. Para que assim fosse, para além da já referida necessidade de mudança e ruptura, ocorrem três aspectos fundamentais em perfeita sincronia. A saber: 1 – A criação de casas de espectáculos como o “Noites Cariocas” e o “Circo Voador” no Rio, e a “Aeroanta” em S. Paulo; 2 – uma geração rara de criadores extremamente talentosos; 3 – uma industria discográfica ávida de novidades.  
Essa época do Rock brasileiro, ou “B Rock” como passou à História, é liderada por um quarteto fundamental de bandas sem as quais nada seria como antes. Tão fundamentais que enquanto umas se mantiveram activas até aos nossos dias outras apesar de desaparecidas continuam a tocar nas rádios e a ser ouvidas por gerações que nem sequer tinham nascido quando tocavam. Estamos a falar de “Paralamas do Sucesso” (Brasília depois Rio de Janeiro),  “Titãs” (S. Paulo)  que de início juntavam as influências new wave e reggae com as da MPB e que mantiveram a formação original até 1992, “Barão Vermelho” ( Rio de Janeiro) que surgem em 1982 liderados por Cazuza, e por fim no mesmo ano os “Legião Urbana” liderada por Renato Russo e terminada em 1996 com a sua morte.
Outras bandas em destaque na década de 80 foram “Sempre Livre”, “Gang 90 e as Absurdettes”, “Biquíni Cavadão”, “Hanói Hanói”, “Hojerizah”, Lobão e os Ronaldos”, “Metro”, “Magazine”, Grafitti”, “Ed Motta e Conexão Japeri”, para além de cantores como Marina Lima, Léo Jaime, Ritchie, Kid Vinil, Fausto Fawcett, entre outros.
Por todo o Brasil as bandas saltavam do anonimato e recebiam banhos de multidão sempre disposta a segui-las em espectáculos e digressões.
No caso do “heavy metal” destaque para os “Sepultura” de Minas Gerais, a banda  brasileira de maior sucesso internacional com letras em inglês. Uma outra banda a conseguir destaque fora de portas foi a paulista “Viper” que também cantava em inglês e que por sua vez ajudou a desenvolver um estilo que se viria a chamar “metal melódico”.
Para além do fenómeno e do triunfo de uma expressão musical exterior num país profundamente marcado pelas suas raízes culturais, o B Rock limitou-se a comprovar a  vocação internacional de um género de expressão que é herança da Humanidade de uma forma global. O Rock, sendo de todos não pertence a lugar nenhum. Nos próximos artigos tentaremos uma abordagem mais íntima ao B Rock, pormenorizando bandas e poemas, tentando imortalizar em crónica mais um momento em que o céu foi o limite.
Até lá…

Artur



quinta-feira, 1 de maio de 2014

G3



"E agora, o povo unido nunca mais será vencido, nunca mais será vencido..."


Passados 40 anos  - e parece que foi há um século - a ingenuidade deste pequeno verso revela o espírito desse tempo, em que tudo era possível. Se nessa altura se pudesse imaginar que o povo não só não está unido, como assiste à sua derrota com uma espécie de medonha, feia e triste ataraxia... É uma guerra, uma guerra suja e sem quarterl. Mas, como acontece em qualquer guerra, nem todas as batalhas são ganhas, nem todas são perdidas. O resultado final é uma espécie de balanço de perdas e ganhos, de terreno conquistado e de terreno perdido, de quem ainda está de pé e de quem se rendeu ou foi esmagado. Neste momento, a escumalha ganha todas as batalhas contra os funcionários públicos, os reformados, os desempregados, os desfavorecidos, os desamparados.Simula perder batalhas contra a EDP, a GALP, os interesses instalados, os grandes escritórios de advogados e os seus representantes no Parlamento, os grupos económicos e todos aqueles que estão instalados à mangedoura do Estado, refocilando nos restos deste descalabro colectivo. Simula apenas; não chega a travar nenhuma batalha contra aqueles que os manipulam e controlam. A simulação também faz parte da arte da guerra. O rolo compressor que a canzoada pôs a triturar a Nação não encontra um obstáculo que o possa parar, dado o estado geral de corrupção e de cobardia que avassala as instituições e os órgãos de soberania. O último baluarte, aquele que ainda resiste, é o Tribunal Constitucional, que se constitui como a derradeira defesa contra a barbárie e a delapidação.

Neste momento, os militares têm fundamentos morais e legais para fazerem uma nova revolução : morais porque os biltres não respeitam nada, nem conhecem limites para a sua actuação criminosa. Legais porque estão sob ataque o povo e a Constituição que juraram defender.