domingo, 2 de agosto de 2009

FUTEBOL, CINEMA, POLÍTICA


GOAL DREAMS

Maya Sanbar, Jeffrey Saunders

Palestina, 2006

Pela mesma razão de que é muito difícil encontrar uma região no planeta em que não se viva a emoção do futebol, também é extremamente difícil fazer um documentário sobre o que quer que seja na Palestina, sem tropeçar em política. Mesmo que esse documentário seja sobre futebol. Essa foi a rápida conclusão a que chegaram Maya Sanbar e Jeffrey Saunders quando decidiram acompanhar a selecção nacional palestiniana desde o seu campo de treinos em Ismailia no Egipto, passando por Grã-Bretanha, Chile, Líbano, Gaza e Estados Unidos conversando com várias pessoas directa ou indirectamente ligadas aos trabalhos da equipa. A política acaba por interferir em todas e cada uma das suas existências.
A Associação Palestiniana de Futebol contratou o treinador austríaco Alfred Riedl para liderar os trabalhos inerentes à qualificação da selecção nacional da Palestina com vista à qualificação do mundial de 2006. Logo à partida o treinador vê-se a braços com uma série de contratempos que, da barreira linguística às lesões, passando pela impossibilidade quase permanente de ter todos os jogadores presentes num único treino, não lhe deixam espaço para uma tarefa fácil. O documentário acabará por se concentrar em quatro jogadores oriundos dos quatro cantos do mundo, mas nem por isso menos empenhados no seu trabalho. Os problemas ( de ordem física, emocional, cultural e geográfica) vão-se acumulando.
Fareed é um palestiniano nascido nos Estados Unidos e criado num subúrbio judeu de Nova Iorque. A sua atitude optimista para com a vida revela-nos um homem que partilha e respeita valores tanto árabes como ocidentais. Queixa-se de nunca conseguir treinar com a equipa completa e das traduções mal feitas.
Kethlun é filho de pai palestiniano, nascido no Chile. Joga no Club Deportivo Palestino, representante da comunidade árabe naquele país. Fala espanhol e inglês mas não esconde a sua perplexidade perante determinados aspectos da cultura árabe, principalmente os mais cruéis. Fala espanhol e inglês, sendo o tradutor de serviço, embora do idioma local nada perceba.
Saleh é o guarda-redes que vem da Faixa de Gaza e que sonha vir a jogar num clube fora da Palestina. O encerramento fronteiriço decretado por Israel dificulta-lhe a circulação. Sempre que se desloca para o exterior para trabalhar fica sujeito a longos períodos de exílio. Os jogadores residentes na Faixa de Gaza estão proibidos por Israel de deixar o território desde que as fronteiras foram fechadas. E de nada valeu uma autorização especial da FIFA.
Por fim, El-Hassan, refugiado palestiniano a viver no Líbano. Desesperado, acaba por renunciar aos e estatuto de refugiado. Conta que no Líbano os refugiados estão proibidos de trabalhar em certas zonas, bem como de requerer a cidadania libanesa. Durante o documentário luta contra uma lesão, acalentando a esperança de ainda conseguir vir a jogar.
GOAL DREAMS é mais do que um registo sobre uma equipa nacional ou sobre histórias cruzadas de jogadores. É fundamentalmente um trabalho acerca de como se vive, se destrói e reconstrói uma identidade. Como se pega nos cacos de uma nação explodida pelo mundo e se volta a colar as peças dispersas. E esse esforço de reconstrução, essa realidade cultural colectiva, passa também pela construção de uma equipa de futebol.

Artur Guilherme Carvalho

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