Vivemos tempos estranhos numa
dramática conjuntura de autêntico genocídio civilizacional e humanista
conduzido por entidades sem rosto que se posicionaram lentamente atrás dos
poderes de decisão para executar a sua agenda. Desprezando-se diariamente todos
os mecanismos de equilíbrio, todas as salvaguardas de compromisso e todas as
protecções da injustiça, o Estado de Direito vai sendo subvertido, a
civilização progressivamente destruída e os valores eclipsados. Temos de um
lado a Democracia, a Liberdade, a ideologia, os valores e as regras que as
salvaguardam, e por outro os “mercados”, a “competitividade”, a ratio económica. Aos poucos a Lei vai-se
esquecendo, torneando, eliminando lentamente em nome de valores vagos e abstractos
onde entidades sem rosto vão impondo o ritmo dos seus lucros. Dois exemplos
evidentes: 1 – A Lei de delimitação dos mandatos autárquicos. Um tribunal
decide que determinada situação é impeditiva (um autarca candidatar-se a mais
do que três mandatos), interpreta a norma. A decisão do tribunal é soberana.
Mas será mesmo? A reacção de alguns implicados nesta categoria é esclarecedora.
Desprezando o papel do tribunal atiram-se a recursos, minimizam, ignoram, quase
escarnecem da sua interpretação.
2 – O Acórdão do Tribunal
Constitucional. Declarada por este Órgão de Soberania a inconstitucionalidade
de algumas normas da Lei do Orçamento de Estado para este ano a reacção de quem
já tinha sido advertido no ano anterior e que nada fez para o corrigir é sintomática.
O TC anda a impedir o progresso, não tem em linha de conta os compromissos
assumidos internacionalmente, em relação aos quais não teve qualquer
responsabilidade. Em suma: A Constituição, os órgãos de soberania e a Lei em
geral andam a emperrar o processo, a atrapalhar a agenda. Mas a agenda de quem?
Precisamente a de quem não tem rosto e se faz representar por tecnocratas sem
espinha nem valores que a tudo obedecem. Se a Lei está no caminho desta agenda,
então anule-se essa Lei e faça-se outra.
Quem diz o exercício do poder
político diz quase tudo de uma maneira geral. Deixou de haver o binómio
esquerda/direita, deixou de haver posições ideológicas. Neste momento ou se está
com o poder financeiro ou contra ele. E quem não está com ele fica irremediavelmente
fora de tudo, não passa da porta do edifício do poder político. Instituições,
empresas, particulares, de repente quase tudo ficou nas mãos dos bancos e da
especulação financeira sem rosto através dos compromissos de empréstimos. Todos
caíram numa ratoeira, num círculo vicioso de dívidas, de dependência destas
entidades que, além de “disponibilizarem” os montantes emprestados não se
submetem a nenhuma possibilidade de risco, de prejuízo. Como tal, além do
financiamento, decidem também da vida dos seus agentes financiados. Explicam
como vão ter que viver, infiltram elementos seus nos seus conselhos de
administração, apropriam-se aos poucos de tudo o que mexe. Quem não se adequar
à sua agenda será pura e simplesmente eliminado do sistema por asfixia
financeira. Quem tem o poder financeiro neste momento é que determina a vida.
Por isso é fantástico ouvir
frases como aquela já antiga que declama a morte da História condenando-a a uma
inutilidade global. Nada interessa que ajude a pensar, que processe qualquer
tipo de entendimento da vida comum. Só o lucro interessa. Mas o lucro destas
corporações invisíveis, intocáveis.
Está declarado pois, o estado de
guerra entre estes seres sem rosto e o resto da Humanidade. E a expressão
“estado de guerra” não é nenhum exagero se pensarmos que, no cômputo final,
milhares e milhares de pessoas vão acabar por perder a vida, pura e
simplesmente desaparecer. Uma situação desproporcionada se tivermos em conta
que a própria classe política está do outro lado, contra a população. O seu
passaporte para a manutenção na actividade depende em exclusivo da prossecução
da agenda do poder financeiro. Ou se joga à bola com eles ou não há jogo.
O futuro deste estado de coisas é
imprevisível embora a explosão seja inevitável. Antes disso a Humanidade (em
risco de genocídio, nunca é demais dizê-lo) tem apenas uma única vantagem. A da
proporção do número. São de facto muito mais as ovelhas neste momento do que os
cães, os pastores e os lobos. O rebanho até aqui desorientado, assustado e
alienado ainda não se apercebeu bem, de uma forma colectiva, que o seu destino
é o matadouro, aconteça o que acontecer. Quando finalmente atingir essa etapa
da consciência, então nessa altura dar-se-á a explosão. Resta saber é se
chegará a tempo.
Artur
1 comentário:
Da parte de seres medíocres, não se esperam moralidades nem imoralidades. Resta-lhes aquilo que lhes está ao alcance e conseguem compreender porque vivem na mais abjecta amoralidade. Os nomes de Eduardo Galeano, ou do recentemente falecido José Luis Sampedro são infelizmente desconhecidos da quase totalidade do rebanho. José Luis sampedro alertava para a alienação da Democracia para uma partidocracia, excrescência que a mata por dentro. De tal forma que o próprio voto já não representa a vontade e o poder do povo.
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