Carlos Tavares de Andrade Afonso
dos Santos (1890 – 1973) ficou conhecido para as artes e letras pelo seu
pseudónimo literário (Carlos Selvagem), alcunha recebida no Colégio Militar
onde fez os seus estudos do ensino secundário entre 1901 e 1907. Destacou-se
como militar, jornalista, escritor, autor dramático e historiador.
Formado em Cavalaria pela Escola do Exército (actual Academia Militar),
esteve no Norte de Moçambique durante a
Primeira Guerra Mundial. Da memória desse tempo publicará “Tropa de África”
(1919).
Através de concurso público é
escolhido para escrever o compêndio a utilizar nas escolas militares,
produzindo para esse fim a obra “Portugal Militar – Compêndio de História
Militar e Naval de Portugal desde as origens do Estado Portucalense até ao fim
da Dinastia de Bragança” (1931), obra de referência ainda hoje utilizada.
No capítulo literário destaca-se
pelas obras de trama histórico, de pendor nacionalista. Uma escrita
marcadamente poética, original, onde o conteúdo ideológico e a crítica social
se combinam com grande coerência. Das suas obras podemos destacar a nível
literário os contos infantis “Picapau – Bonecos Falantes” e o romance “Espada
de Fogo”. A nível dramatúrgico vamos encontrar peças de grande repercussão na sociedade
portuguesa de então como “Entre Giestas”, “Ninho de Águias”, “Telmo o
Aventureiro” e “Dulcineia ou a última aventura de D. Quixote”. Trabalhou
diversas vezes com a dupla Amélia Rey Colaço – Robles Monteiro, cabeça de uma
das mais importantes companhias teatrais do séc. XX, sendo a sua obra
considerada das mais representativas da dramaturgia desse mesmo tempo. De uma
forma geral, tanto a vida como a obra de Carlos Selvagem ficam indelevelmente
marcados por dois valores fundamentais, dois eixos sobre os quais tudo assenta.
São eles a “Moral” e a “Coerência”(*).
Muito mais relevante do que à
partida se poderia pensar, a obra de Carlos Selvagem é um importantíssimo
instrumento de análise do seu tempo na medida em que se debruça sobre temas
incontornáveis tanto da sociedade como da política numa perspectiva equilibrada
entre a pedagogia e a formação.
Enquanto estudioso e defensor do Império Colonial destaca-se a
importância a nível histórico da interculturalidade, que questiona alguns dos
fundamentos da política colonial do Estado Novo (*). Em termos teatrais, as
suas peças representam um quadro emocional agitado, conflituante e revoltado
combinado com a actualidade política e económica. As intrigas do quotidiano são
reflexos dessa mesma sociedade onde têm lugar. A crónica de costumes não surge
de geração espontânea, tem uma razão de ser, é proveniente de um determinado
estado de coisas.
Na parte literária, mais
diversificada, reconhece-se o testemunho humano em seres comuns, que nem sempre
são referências históricas nem pertencentes a elites com ideal moral, como
acontece na obra historiográfica (*). As suas personagens, seja qual for o
espaço em que se enquadram, traçam rumos marcados tanto pela sorte como pelas
consequências dos seus actos. O que se destaca sempre é por um lado a dimensão
humanista e por outro, um sistema de valores privilegiados (*).
Em termos políticos, Carlos
Selvagem, apesar de nacionalista, tinha as suas divergências com o Estado Novo,
culminando nos acontecimentos de Abril de 1947, a primeira tentativa
para derrubar Salazar a seguir à II Guerra Mundial. Sob o comando do Almirante
Mendes Cabeçadas, o coronel Carlos Santos acaba por integrar um movimento
revoltoso que foi baptizado de “Junta de Libertação Nacional” com o objectivo
de “repor o espírito inicial democrático do Golpe de 28 de Maio de 1926” . Acabou por ser preso.
Artur
(*) “O Olhar de Carlos Selvagem
sobre Portugal d’aquém-mar e de além-mar “
Jorge, Helena dos Anjos Reis
Tese de Doutoramento em
Literatura na especialidade de Língua Portuguesa
Universidade Aberta
2005 (?)
1 comentário:
Enviar um comentário