sexta-feira, 4 de setembro de 2009

I.D.




Philip Davies

Reino Unido, 1995

Este é um filme a que podemos regressar várias vezes sem nunca nos arrependermos. Por várias razões. Ao abordar um aspecto politicamente incorrecto do mundo do futebol (o fenómeno do hooliganismo) não nos mostra uma única imagem de um jogo. Ao focar-se na temática da violência evita a exibição gratuita e inconsequente de acções violentas, permitindo a evolução dos personagens no correr da narrativa, sendo essa a principal razão da concentração do espectador. Acompanhando um tipo de comportamento difícil de aceitar, vai abrindo novas dimensões de análise e entendimento sobre o fenómeno nos meandros sociológicos da sua justificação. Senão, vejamos.
Nos anos 80 quatro polícias são nomeados para uma operação de infiltração no seio de uma das mais perigosas “firmas” (grupos de apoio em Inglaterra) do leste londrino, a do clube Shadwell F.C. (clube fictício). A polícia pretende saber de onde provém a orientação das sucessivas vagas de violência de rua causadas por esta firma. Quem as coordena nos bastidores. John (Reece Dinsdale) é aquele que mais se vai envolvendo nessa missão, deixando-se progressivamente integrar demasiado no meio da multidão de suspeitos que era suposto fiscalizar. Os seus sinais de perturbação começam a fazer-se sentir. A sua posição profissional e o seu casamento começam a degradar-se. Afastado dos dois, vamos acabar por encontrá-lo numa manifestação de neo-nazis, uma personagem completamente diferente da que nos foi apresentada no início do filme. E a excelente interpretação deste actor acaba por reforçar a linha mestra de toda a narrativa. Um homem aparentemente equilibrado e consciente das suas funções no seio da comunidade transforma-se num marginal violento. O problema de John é um problema de identidade. (I.D.). Ao integrar um modo de vida diferente do seu, não lhe consegue resistir, emergindo uma outra (ou não) personalidade.
O pendor hiper-realista do filme prende-nos até o último instante sem nos dar tempo para respirar. Mais do que as cenas de violência é o ambiente e o excelente trabalho dos actores que nos envolvem numa atmosfera de terror, principalmente pela credibilidade da situação. As frustrações e contradições da sociedade transformam cidadãos comuns em máquinas de violência extrema. Tendo o futebol como pretexto, esta violência é parte da sociedade em que vivemos, ou, o que é mais aterrador, parte de qualquer um de nós.
Por fim, I.D. é também uma história de choque de classes na época da Inglaterra de Margaret Thatcher (cuja imagem é recorrente nas paredes dos edifícios públicos). De um lado a classe média idealista, suburbana, proprietária e instável, contra a classe trabalhadora dos operários brancos, esquecida e desprezada durante esses anos. Apesar de toda a boa vontade da primeira, os polícias revêem-se no tempo em que foram jovens. O abismo onde a violência e a pobreza esmagam qualquer possibilidade integrada de lidar com a frustração.

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