terça-feira, 9 de julho de 2024

PORQUE É VERÃO


 No nono dia do sétimo mês de dois mil e vinte e quatro entra o vento pelo balcão adentro e a folhagem das árvores dança em frente. A Dora trota feliz entre o jardim e o pomar, parando só para pôr o focinho no ar que traz o cheiro equino da vizinhança mais ao lado. Serão póneis, serão cavalos ? São amigos certamente, que relincham à presença dela, à visão dos flancos e das curvas delineados pelo sol nascente.

É verão e a natureza das coisas simples a despertar os sentidos da estação mais quente.
Os gatos dormitam pela casa e quase se incomodam com a passagem abrupta de vassouras e aspiradores. Resmungam e passam para o lado de fora a tremer os maxilares para a próxima presa enquanto eu caço do lado de dentro as palavras e as poeiras, as teias esquecidas e a contas perdidas, bilhetes e cartas de amor escritas antes de eu nascer.
Tudo isto vai da grande realidade onde sou até às pequenas onde vou. O meu núcleo vai-se abrindo a cada dia às funções repetidas e às por fazer, como a ondulação gerada pela pedra que atiramos ao lago. Há um efeito para cada pequeno feito e é assim que vou andando, já que perguntam e dizem que têm saudades, hoje melhor do que ontem e menos bem do que amanhã.
Tocou o despertador e esta tarefa terminou. Os gatos voltaram aos seus lugares, a Dora aguarda a taça de cereais e o Lucky dorme profundamente atrás de mim. Os pássaros aumentaram a sinfonia anunciando um dia melhor.

Elsa Bettencourt