quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
quinta-feira, 24 de janeiro de 2013
quarta-feira, 16 de janeiro de 2013
sexta-feira, 11 de janeiro de 2013
JUSTE UNE IMAGE
Num café anónimo de uma cidade
qualquer a noite levanta-se devagar. Lá dentro um casal prepara-se para beber
um café ou comer qualquer coisa. Cá fora um cão faz o reconhecimento do terreno
com o nariz enquanto espera o regresso do dono. Nesta imagem tranquila, o mundo
não tem lugar com as suas misérias e desgraças do costume. Celebra-se um
momento de paz, uma simples situação em que por momentos tudo está no lugar
onde devia estar, tudo faz sentido, todas as formas e todas as cores se encaixam
entre si em harmonia. Descendente da esplanada nocturna de um café em Arles
(Van Gogh), esta também poderia ser a primeira imagem de um filme de Wenders,
um “estado das coisas” ou um “movimento em falso”, da sua primeira fase. Esta
podia ser a imagem que antecede as rodagens de um filme de Scorcese, no momento
exactamente posterior à sua equipa ter molhado as ruas para melhor fazer
sobressair as luzes e as formas nocturnas da cidade. Mas não. É apenas a imagem
de dois amigos meus entretidos no seu fim de dia, com um cão cá fora a cheirar
as pedras do chão. Não será nada de espectacular, muito menos original. Nas
palavras de Goddard, não será uma imagem justa, será simplesmente uma imagem.
Uma imagem que me aquece a alma pela simplicidade tranquila com que se
apresenta. Uma imagem onde cabem os meus dois amigos João e Ana na rotina do
seu tempo. Apenas uma imagem…
Artur
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
quarta-feira, 9 de janeiro de 2013
LANÇAMENTO
Convido todos os que quiserem e puderem a estar presentes no lançamento do meu último romance.
Artur Guilherme Carvalho
terça-feira, 8 de janeiro de 2013
O DESENCONTRO DO LOBO
Chego cansado do trabalho e
encho-me com o amanhecer como se fosse o mais deslumbrante milagre da vida. A
luz vai-se erguendo tímida e incerta, devolvendo à cidade as formas perdidas no
escuro da noite. A estrada assume o seu destino, as casas erguem-se orgulhosas
no alinhamento das ruas, as pessoas caminham em todas as direcções, o carro
assume vontade própria e pára à porta da tua casa. Como um autómato encontro no
bolso a chave que nunca tive e subo as escadas que nunca subi para te
encontrar, ou voltar a ver na cama onde nunca dormi. Acordas do sonho com um
sorriso de boas vindas e sentas-te lentamente como se todas as manhãs
estivesses à minha espera. A tua boca que eu não beijo de forma sôfrega e
desesperada diz o nome que nunca soube dizer e que por acaso é o meu. Os corpos
falam entre si recordando as formas que nunca conheceram como velhos amigos. E
recordam manhãs de despedida entre promessas e lágrimas de eternidade, noites
desenfreadas de paixão inexistente, carícias nunca executadas, obstáculos e
mais obstáculos que nos mantiveram longe, muito longe de nós. As horas dos
encontros em que nunca nos encontrámos desfilam num corrupio de memórias,
enquanto o chá e as torradas passam de mão em mão. Deixei de te ver quando caiu
o nevoeiro antes da minha última batalha contra os invasores, deixei de
acreditar em ti depois de uma intriga que me convenceu que tudo estava perdido
para o nosso lado, toda a nossa história é um desfile de desencontros e mal
entendidos, excelentes objectos de romances e filmes, canções e quadros. Tal
como aquela lenda medieval de uma mulher que caminhava de noite com um lobo e
de um cavaleiro que galopava de dia com um falcão fêmea no braço. A maldição
que os possuía só os deixava ser homem e mulher duas vezes. Ao entardecer e ao
nascer do dia. Por isso erravam juntos, humano e animal. Assim, lentamente
crescem as penas no teu corpo logo a seguir a terminares o chá. Os teus braços
abrem-se cada vez maiores até serem asas. Já nem sobra tempo para um adeus. Escolhes
a janela da cozinha e voas lá para fora. Agarrado a um resto de torrada fica um
homem a uivar antes de adormecer, fica a memória de um lobo que de noite se
arrastou por entre as sombras da floresta. Na manhã que nunca te encontrei as
memórias desaparecem enquanto o Sol nasce, os encontros assumem o seu destino
na linha do tempo, os corpos regressam às suas formas escondidas pela noite, o
carro ganha vontade própria e o destino é sempre um desencontro mal combinado,
uma piada de mau gosto de que ninguém se lembra antes de rir.
Artur
sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
LABIRINTOS
Os sonhos ficam localizados á
entrada dos territórios da lucidez. A peça final de um puzzle que se andava a
montar há bastante tempo, a solução de um problema, a iluminação necessária
para arrumar uma contradição. Sem ser através de palavras ou de uma outra
qualquer construção racional, as mensagens dos sonhos vêm até nós sob a forma
sensorial/vibratória, não são para ser lidas nem inteligíveis. Alojam-se no Ser
e espalham a sua vibração, comunicando assim a sua mensagem. Restam-me 10/15
anos de vida útil e tenho sido ao longo dos anos um verdadeiro campeão do
desperdício de tempo. A Vida é uma dádiva, sem dúvida, mas uma dádiva
armadilhada, um presente embrulhado em papel de absurdo. É uma dádiva na medida
de todas as possibilidades que nos oferece através das experiências e dos
contactos com os outros seres, mas carrega consigo um sem fim de exigências, de
pressupostos, de obrigatoriedades que têm de comum estarem sempre a afastar-nos
do nosso caminho, da nossa verdadeira natureza. Daí que a frustração seja na
maior parte dos casos a nossa companheira mais presente. Antes de morrer
gostaria de escrever mais um livro ou dois. Mas antes de poder-me dedicar a
essa tarefa tenho de preencher uma série de requisitos, de cumprir um sem fim
de prioridades, satisfazer uma data de obrigações, que não sei se terei tempo
para o que realmente (me) importa. Não se escolhe ser escritor, ou criador em
geral. A escrita está dentro de quem escreve como o ar que respira, o ar que
tem de ser trabalhado pelo sistema respiratório e devolvido à atmosfera. Não se
trata de uma escolha mas antes de uma descoberta, a da nossa natureza, a da
identidade do Ser. Escreve-se por inúmeras razões, sendo a mais evidente a de
tentar evitar rebentar por dentro.
Por isso compreendo perfeitamente
a frase de Kafka quando dizia que na sua vida lhe interessava apenas e só a
Literatura. Tudo o resto era um desperdício, uma perda de tempo. Um tempo que
nos fazem perder desde que nascemos com uma encenação barata que mais não é que
a justificação permanente de um sistema, de uma condição, de um modo de vida em
que se embeleza a condição de escravo de uma maioria para o enriquecimento de
um punhado de espertos. Os padrões culturais e religiosos vão cumprindo o seu
papel de domesticação de uma espécie (a nossa) afastando-a das suas raízes, da
profundidade do seu Ser. A raiva, o ódio, a violência são expressões desse
afastamento, cuidadosamente aproveitados para beneficiar sempre no mesmo
sentido. São as válvulas de escape que nada aliviam para que todos se sintam
mais aliviados.
De modo que vivemos numa condição
onde reina o “tragicamente patético” ou o “pateticamente trágico”. Exemplos,
apenas dois. Os eternos programas de debates, tão uniformemente iguais em todas
as estações de televisão do mundo inteiro, onde especialistas em generalidades
se espremem para debitar conceitos, repetir cantigas antigas, em suma, pavonear
um determinado tipo de conhecimento inútil, inodoro e inconsequente. Após os
seus números tudo vai continuar a acontecer exactamente da mesma maneira. As
tragédias, as tragédias que são noticiadas até à exaustão, os massacres, as
guerras, as mortes de crianças, sem que nada aconteça que as consiga evitar.
Tenho que ficar longe destes debates estéreis e destas tragédias absurdas para
preservar a minha sanidade mental. Tenho que me fechar ainda mais no espaço da
minha natureza e trabalhar a partir daí. A idade afasta-me cada vez mais do
erro ou da vontade de errar porque cada vez tenho menos forças para pedir
desculpa e para repetir o que no passado foi lido como errado. O sonho da
última noite enviou-me mais um aviso. Tenho mais 10/15 anos de vida útil à
minha frente e é melhor equacionar e destacar o que é realmente importante.
Além da família e dos amigos, tenho que deixar feitos mais um ou dois livros,
isso sim é que importa. A insanidade do mundo não cabe toda nas minhas costas,
é um peso excessivo, um problema que não me cabe resolver. A intoxicação de uma
informação inútil e permanente não me serve para nada. Os sonhos falam comigo.
Felizmente com cada vez mais tempo, cada vez mais dentro dos territórios da
lucidez.
Artur
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