sábado, 18 de maio de 2013

HISTÓRIAS DE UM ASSASSINATO




                                                        O Presidente Sidónio Pais
Toda a verdade tem dois lados e nenhum deles é permanente. Um acontecimento histórico terá a relevância que as suas consequências lhe puderem dar, será analisado ao detalhe, cortado ás fatias e separado ás peças, sendo cada uma delas filtrada pela lógica científica que aproveitará os factos, a verdade material e a versão institucional. A seguir volta-se a remontar o acontecimento antes de o inserir sob a forma final nos compêndios de História. A outra vertente do acontecimento histórico é aquela que o consegue abordar e conhecer desvendando as várias histórias que lhe deram origem, as lendas, as personagens e os seus caminhos. Neste caso obteremos sempre uma outra verdade, mais difusa mas também mais abrangente. Uma verdade de aproximação ao tempo e ás pessoas, à lenda e ao facto, ao mito e à matéria.

Sidónio Pais é uma figura lendária do primeiro período republicano da nossa História do séc. XX, hábil e eficaz utilizador da propaganda em torno do culto da personalidade, homem que conseguiu extrapolar em muito o resultado da sua obra, da construção do mito. Tudo em Sidónio Pais passava por um crivo cénico antes de ser dado a conhecer ao mundo desde as suas paradas em uniforme de Major muitos anos depois de retirado do Exército até à sua própria morte. Politicamente o breve consulado de Sidónio Pais (1917 -1918) consistiu em subverter as instituições democráticas, nascidas com a revolução republicana em 1910, e alicerçar uma espécie de poder autoritário concentrado numa única instituição (o Presidente da República) e numa única personalidade (a dele). Fez-se “coroar” Presidente à revelia do Congresso, liquidou o sistema parlamentar democrático, impôs a censura à imprensa, encheu as prisões com milhares de opositores políticos. Acabou assassinado na estação do Rossio em 1918.


- A Morte


Tal como em vida, a morte de Sidónio Pais teve todos os contornos teatrais que muito contribuíram para o nascimento do mártir e a consagração do mito. A 14 de Dezembro de 1918, quando o Presidente da República se preparava para embarcar na estação do Rossio para uma viagem ao Norte do país, um homem furou o cordão de segurança e (segundo a versão oficial) disparou dois tiros à queima roupa, ferindo-o de morte. Muito propagandeada na altura pelos seus seguidores e apoiantes, foram as suas últimas palavras antes de morrer: “Morro bem…salvem a Pátria”. Contrariando esta versão houve testemunhas presenciais que garantiram que o presidente teve morte imediata, sem tempo para proferir o que quer que fosse. Noutro lugar ficamos a saber que esse famoso discurso final se deveu a uma crónica do jornalista Reinaldo Ferreira (o famoso Repórter X), conhecido pelas suas crónicas efabuladas e mesmo fantasiosas, que chegou ao local mais de uma hora depois dos acontecimentos.

                                           Representação do momento da morte do presidente

De acordo com a autópsia do presidente, levada a cabo pelo então jovem médico legista Asdrúbal de Aguiar, e após análises às roupas e à arma do assassino, ficamos a saber que a vítima foi alvo de um tiro, e não dois como se pensou durante muito tempo. Os dois orifícios encontrados no cadáver correspondiam a uma entrada e uma saída do mesmo projéctil e não a dois. Por outro lado, a autópsia revela ainda que a vítima teria sido atingida não à queima-roupa mas à distância. A este propósito leia-se “Mataram o Sidónio” de Francisco Moita Flores.



- O Assassino

Sobre o autor (oficial ou material) da morte de Sidónio Pais, duas breves notas prévias. Em primeiro lugar, após os disparos e da enorme confusão que de imediato se instalou, e de que resultaram quatro mortos, não fugiu nem ofereceu resistência. Foi brutalmente espancado e torturado durante dias e dias. Em segundo lugar, morreu em 1946, internado no Hospital Miguel Bombarda ao fim de 28 anos de prisão sem nunca ter sido julgado.

                                                                 José Júlio da Costa

José Júlio da Costa nasce em Garvão, concelho de Ourique, em 1893, o segundo de sete filhos. Com 16 anos, a 21 de Maio de 1910, alista-se no Exército Português. Estará presente no levantamento militar da revolução republicana de  5 de Outubro do mesmo ano. Enquanto militar esteve em Timor, Moçambique e Angola, tendo obtido um louvor em 1914. Abandona o Exército em 1916 no posto de segundo sargento regressando à sua terra de origem. Tenta ainda realistar-se como voluntário para a Primeira Guerra Mundial mas foi recusado. Quando em 1918 ocorreu uma greve dos trabalhadores rurais de vale de Santiago. José Júlio da Costa assumiu a posição de negociador entre as autoridades e os revoltosos, acabando por conseguir um acordo. A actuação daqueles trabalhadores, liderados pela ala anarquista da “Comuna da Luz” de António Gonçalves Correia foi considerada como perigosa para a ordem pública e o Governo não aceitou os termos do acordo. Os grevistas foram severamente punidos, tendo muitos sido deportados para África.

Sentindo-se traído pela falta de palavra das autoridades, José Júlio da Costa jura vingar os seus conterrâneos do Vale de Santiago, optando por assassinar o Presidente Sidónio Pais.


Artur



7 comentários:

Hélder disse...

Quantos puros de alma quando atraiçoados deram em assassinos?...
A versão oficial da história dos povos e das pessoas será sempre discutível por ser a de quem a escrever, e quem a escreve está sempre do lado que ganha. Por isso...

Obrigado Artur. Abraço.

Maria disse...

Meu avô contava-me que assistiu à morte de Sidónio Pais, pois pertencia ao batalhão que estava para embarcar para França, onde já se encontravam cinco de oito irmãos nessa guerra...

Por morte de Sidónio Pais esse batalhão já não partiu para França.

José Pereira disse...

Caros Srs
Muito agradecido por contribuírem para esta história, contudo não me parece que a fotografia exposta possa ser de José Júlio da Costa, agradecia que me informassem as fontes de onde a mesma foi obtida.
Cumprimentos
José Pereira Malveiro

Artur Guilherme Carvalho disse...

Caro José Pereira,
A fotografia referente a José Julio da Costa foi retirada de um arquivo da própria internet clicando o seu nome. Muito obrigado pela sua visita e pelo comentário. Desculpe só hoje lhe responder mas só vim aqui ao fim deste tempo todo agora. Os meus cumprimentos e volte sempre.

José Pereira disse...

Caro Artur Guilherme
Obrigado pela sua resposta, contudo aproveito para esclarecer que a fotografia apresentada não corresponde a José Júlio da Costa mas a um politico Argentino de nome Jose A. Costa, como se poderá constar no link abaixo descrito:
https://es.wikipedia.org/wiki/Julio_A._Costa
Onde poderá encontrar, caso entenda, fotos de José Júlio da Costa será em:
http://garvao.blogs.sapo.pt/jose-julio-da-costa-6884
Com os melhores cumprimentos
José Pereira Malveiro

Artur Guilherme Carvalho disse...

Caro José Pereira,
A correcção está feita. A actual fotografia corresponde à identidade de José Júlio da Costa. Muito obrigado pelo seu alerta e volte sempre.
Artur

José Rodrigo de alencar disse...

Incrivél 28 sem condenação.