IF
No final da década de 60, um
grupo de jovens de um colégio interno inglês começa a despertar para o mundo e
para a vida, vendo-se confrontado com um quotidiano de reclusão, disciplina férrea
e abuso de autoridade sobre as suas pessoas. Mick Travis (Malcolm McDowell) e os seus companheiros
encontram-se no meio da hierarquia etária, entre os mais desprotegidos e os “Whips”,
os mais velhos, encarregados de manter a disciplina, aplicar castigos, fazer
dos outros seus criados pessoais.
Influenciado pelos “ecos” do Maio
de 68 e, a nível estrutural, pelo filme ZERO DE CONDUITE (1933), de Jean Vigo,
o filme aborda de uma forma libertária a questão do ensino nos colégios
internos ingleses (public schools) com um olhar bastante duro, e por consequência
a própria sociedade britânica e as suas relações de força e equilíbrio.
Numa época de transformação e
conflito, em que tudo é questionado e tudo é experimentado, o grupo de Mick
Travis culminará a sua emancipação da pior forma possível. No dia da cerimónia
do ano escolar, socorridos de armamento encontrado numa cave, esquecido da última
guerra, Travis, a sua namorada e os outros, sobem aos telhados do colégio e
desatam a disparar indiscriminadamente causando o pânico e a destruição entre
alunos, pais e professores. Este desenlace aparentemente improvável, este grito
rebelde contra a instituição e aquilo que ela representa, surge não enquanto
elemento anormal caído do céu por razão nenhuma, mas antes como consequência
perfeitamente previsível, ainda que numa escala desequilibrada e
desproporcional. A alegoria da revolta inscreve-se na velha máxima de que, os
humanos são sempre uma consequência do meio onde vivem. Tratados com violência
e injustiça, tendem a ser violentos e injustos. A cena final, que tanto e
tantos escandalizou, não é mais do que um exercício de lógica em torno da forma
como tudo se estrutura para trás.
Sinal de um tempo, identidade da
revolta, delírio libertário, surrealismo conceptual, a base é toda ela assente
em parâmetros reais, a que não será alheio o facto de tanto o realizador como
os dois autores do argumento (David Sherwin e John Howlet) terem sido alunos de
colégios internos ingleses.
Embora houvesse quem especulasse
que a alternância entre cenas a preto e branco e a cores fosse devida a estados
de Realidade/Fantasia, tal não aconteceu. Algumas cenas foram rodadas a preto e
branco para obstar o facto de as janelas da escola onde decorrem as filmagens
permitirem uma entrada de luz muito intensa que a cores iria inviabilizar a
imagem. No entanto a oscilação entre a Sátira e a Fantasia combinam o par
perfeito que a escolha da película não preencheu.
Outra nota curiosa é a de que a
banda sonora do filme ser toda ela constituída por uma única peça. Trata-se de “Sanctus”
da “Missa Luba”, uma versão africana da missa em latim cantada por um coro de
crianças congolesas.
IF é um marco na história do
cinema libertário na medida em que, influenciado pelos tempos em que foi feito
desenvolve a eterna possibilidade da concretização da liberdade ao alcance do
ser humano. As ovelhas podem perfeitamente transformar-se em lobos e
contra-atacar quem as oprime. A História é um folhetim gigantesco acerca do
homem oprimido e da sua luta para a libertação por um lado, e da reorganização
da repressão e domínio de poucos para transformar de novo os lobos em ovelhas. Um folhetim
em dois actos que se repete pelos séculos dos séculos. Nunca está fora de moda
por mais que digam o contrário. Palma de Ouro em Cannes (1969), o filme foi
também distinguido na revista “Total Film” como o 16º melhor de sempre na lista
de filmes britânicos.
IF é um marco na história da
consciência da humanidade, um filme sempre actual que deveria ser (re)visto em
cada geração…
Artur
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