sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
MARINA
Iniciando a sua carreira apontando a um público juvenil (El Príncipe de la Niebla, El Palácio de la Medianoche e Las Luces de Septiembre), Carlos Ruiz Zafon chegou até nós com “A Sombra do Vento”, título que o catapultou para o sucesso e consagração internacional. Seguiu-se “O Jogo do Anjo”, onde regressou ao famoso Cemitério dos Livros Esquecidos na imaginária Barcelona. Tendo estes dois últimos títulos como alvo um público mais adulto, “Marina” representa a fronteira na sua obra em que a maturidade literária se confirma, em que está feito o ensaio para voos mais altos. Anterior a “A Sombra do Vento” (2001), “Marina” foi publicada pela primeira vez em 1999 e antecipa o universo narrativo do autor para as próximas obras.
Numa cidade misteriosa, gótica, onde vários tempos coexistem num tempo só, o convite para mundos fantásticos torna-se o grande desafio, protagonizado por personagens que ficaram perdidas noutras épocas, que vivem em palácios esquecidos ou na rede clandestina de esgotos, em teatros em ruínas ou no “Cemitério dos Livros Esquecidos”, esse local inexistente mas tão provável numa cidade como Barcelona. O universo de Zafon é só por si uma ordem irrealista, uma proposta imaginária que se intromete na realidade, que desafia o quotidiano e que, nessa relação entre o possível e o impossível desenrola a sua história. O passado mergulha no presente e pede-lhe explicações, obriga-o ou a continuar ou a resolver os enigmas que ficaram para trás sem solução. As histórias de amor são também elas, enredos impossíveis que não podem acabar bem. No caso de “Marina”, Óscar Drai, vítima da sua vertente sonhadora acaba por ser atraído a um dos muitos palacetes modernistas onde gosta de deambular depois das aulas. Numa dessas fugas, conhece Marina com quem irá viver uma aventura extraordinária onde não falta o mistério, um segredo de família e um enigma do passado para desvendar.
E é neste território improvável entre o passado e o presente, entre a realidade e a fantasia, entre amantes de um amor impossível que tudo faz sentido, numa maneira crua e ao mesmo tempo fantástica. Os personagens de Zafon não terminam nunca num final feliz em que tudo se resolve, precisamente porque essa é a linguagem da vida real. Os enigmas, em lugar de serem definitivamente resolvidos, antes deixam partes acabadas, escondendo outras por revelar. Porque “só nos lembramos daquilo que não aconteceu”, a nossa vida é uma corrida permanente de ajustes de contas, amizades improváveis, castigos injustos, paixões impossíveis.
A capacidade de confrontar a realidade com a imaginação através de um código consequente de leitura provável e a cadência narrativa envolvente das situações são o segredo do sucesso deste autor de Barcelona. Sabemos que o “Cemitério dos Livros Esquecidos” não existe…mas não vamos descansar enquanto não houver alguém que o encontre…
Artur
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