sexta-feira, 5 de junho de 2009
UM ARRANQUE ACIDENTADO
UM ARRANQUE ACIDENTADO
Integrado na vanguarda mundial, o cinema português dava os seus primeiros passos. A iniciativa de Rousby deixara as suas sementes com o Animatógrafo e, desta forma, Manuel Maria da Costa Veiga (foto de cima), associando-se ao capitalista Alexandre Mó, começa a exibir filmes em vários locais de Lisboa.
Em 1899 Costa Veiga adquire uma câmara em segunda mão, e anos mais tarde funda em Algés a primeira produtora portuguesa, a Portugal Filmes. Ao contrário de Paz dos Reis, que tem na actividade laboral o seu objecto fílmico, Veiga vai a Cascais até à praia filmar el-rei D. Carlos, primeiro a banhos e depois em visita ao Sporting Club local. A Portugal Filmes trabalhou intensamente nos primeiros anos do séc. XX sendo a maioria dos seus trabalhos de carácter documental. Desde a reportagem (visita do Kaiser Guilherme II a Portugal, idem sobre os reis de Espanha) até ao registo das terras portuguesas, também conhecido como “filmes panorâmicos”. Os filmes de Costa Veiga têm por cenário o período conturbado do final da monarquia portuguesa. Sabe-se que esteve na Rotunda captando os acontecimentos da Revolução do 5 de Outubro de 1910. A Portugal Filmes continuou a trabalhar até 1918.
Em termos de iniciativas de produção, na primeira década do séc. XX há a registar três momentos fundamentais: - A Portugália Filme ligada a João Freire Correia, D. Nuno Almada e Manuel Cardoso em 1909; a Empresa Cinematográfica Ideal fundada por Júlio Costa no mesmo ano; a Luzitânia Film, gerida por Celestino Soares, Reis Santos e tendo Júlio Potes como financiador, no ano de 1918.
João Freire Correia, como Paz dos Reis, era fotógrafo e possuía uma câmara de filmar adquirida em França em segunda mão. Solicitado pelo empresário Luís Ruas para incluir um quadro filmado na revista popular “ Ó da Guarda”, realizou “O Rapto de Uma Actriz”, o primeiro filme português de enredo. Um dos actores envolvidos nesse projecto, Nascimento Fernandes, acabaria por fundar em 1919, em parceria com Amélia Ferreira, uma produtora que produziria três filmes cómicos nos estúdios de Barcelona.
E é a mesma Portugália Filme que após a rodagem de vários documentários ( onde se destaca TERRAMOTO DE BENAVENTE, reportagem dos efeitos devastadores de um tremor de terra na localidade referida), embarca na segunda tentativa de filme de enredo.
Com uma primeira fase abortada em 1909, em 1911 OS CRIMES DE DIOGO ALVES (foto acima) estreiam em Abril no Salão Trindade em Lisboa. A escolha recaiu sobre a vida de um grande criminoso que nos idos do século anterior havia despertado o terror e a imaginação da população de Lisboa, atirando as suas vítimas do Aqueduto das Águas Livres abaixo. Os seus crimes ficaram conhecidos através de brochuras populares da série “Os Criminosos Célebres”. Esta é oficialmente apontada como a primeira obra de ficção rodada entre nós. O filme surpreendia pelo realismo e crueldade das cenas, bem como pelo equilíbrio entre exteriores e interiores, acentuando o carácter popular das imagens. O êxito de bilheteira fez esgotar todas as oito sessões programadas.
A empresa Cinematográfica Ideal arranca com o objectivo de explorar o mercado português através de produção própria. Enquanto vai construindo um estúdio junto ao Castelo de S. Jorge, o operador Júlio Santos filma numerosas reportagens. A produtora produz uma comédia sem grande relevo (CHANCELER ATRAIÇOADO) e um êxito estreado no Sala Central (RAINHA DEPOIS DE MORTA), acerca da lenda de Inês de Castro. No ano de implantação da República (1910), o cinema e o público mantinham a preferência pela tradição. Tudo termina tragicamente para Cinematográfica Ideal no Verão de 1911 com um incêndio no morro do castelo.
Os anos seguintes vêm surgir uma série de iniciativas isoladas. È o caso de PRATAS CONQUISTADOR (1917) de Emídio Ribeiro Pratas, uma réplica dos filmes de Charlie Chaplin; os primeiros filmes dos Serviços Cartográficos do Exército em torno da realidade das trincheiras e do Corpo Expedicionário Português na I Guerra Mundial; uma primeira experiência do “filme científico” realizada pelo Professor Costa Lobo acerca de um eclipse solar ocorrido em 1912; vários trabalhos documentais; um dos primeiros trabalhos de técnica publicitária (UM CHÁ NAS NUVENS), filmado com os funâmbulos Puertollanos na Torre dos Clérigos no Porto.
Os finais da década são também o alvorecer das ideias futuristas, do Modernismo e da adoração pela máquina. A geração de “Orfeu”, pela intervenção de António Ferro e da sua conferência “As Grandes Trágicas do Silêncio”, sente a emergência da nova estética no respirar do cinema. Trata-se agora de levar a tela branca para longe da barraca de feira, do exclusivo sentir popular, e dar-lhe um novo conteúdo. Estes precursores das novas correntes estéticas entram no cinema pela porta da Luzitânea Filme, destacando-se Luís Reis Santos, futuro grande crítico de artes e letras, e Leitão de Barros, que nesta empresa realiza os seus dois primeiros filmes MALMEQUER e MAL DE ESPANHA, ambos no ano de 1918. Ainda ligado à mesma produtora vai aparecer Cotinelli Telmo, o futuro realizador da CANÇÃO DE LISBOA. Os dois primeiros filmes de Leitão de Barros redundam em fiasco tanto de público como de crítica. Empenhada em apresentar um sentimento de acordo com um nacionalismo tradicional, a Luzitânea Filme. Assim os títulos TOURADA NO CAMPO PEQUENO e VIAGEM AO NORTE DO PRESIDENTE SIDÓNIO PAIS constituem dois marcos documentais dessas intenções. Factores inesperados como a grande epidemia pneumónica (que leva a fechar as salas de espectáculos como o Coliseu, arrendado pela firma para exploração) fecham a sobrevivência da Luzitânea. Nem a construção de um estúdio moderno nem a constituição de uma excelente equipa de técnicos encabeçada pelo operador-chefe Costa Veiga e composta por nomes como Cotinelli Telmo, Stuart Carvalhais e Artur Costa Macedo chegou para manter de pé o projecto. O sonho de uma produção regular no cinema português ficava mais uma vez adiado.
ARTUR
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