terça-feira, 24 de abril de 2012

24 de ABRIL 1974 / 24 de ABRIL 2012

"O valor hoje mais caluniado é certamente o valor da liberdade. Bons espíritos (sempre pensei que havia duas espécies de inteligência, a inteligência inteligente e a inteligência estúpida) fazem doutrina de ela não ser senão um obstáculo ao caminho do verdadeiro progresso"

Albert Camus


Hoje é dia 24 de Abril. Amanhã será dia 25 de Abril (como vês, gasparzinho, as tuas piadas parvas, grosseiras, torpes e inanes sempre ensinam alguma coisa. Formalmente ainda vivemos num regime democrático (o passos coelho foi eleito democraticamente e democraticamente há-de ser corrido para o caixote de lixo da história dentro de três anos). Mas, por entre os dislates proferidos pela canalha, com o tom solene e o ar grave das grandes ocasiões ou das verdades escritas na pedra, vamos percebendo que estes políticos/negociantes querem fazer da liberdade um uso exclusivo e unilateral, considerando-o mais como um direito (do mais forte) do que um dever, não receando pô-la, tão frequentemente quanto puderem, como uma liberdade de princípio ao serviço de uma opressão de facto. Essa é apenas uma das facetas deste regresso a 24 de Abril de 1974. Outra, igualmente preocupante, revela-se no desprezo que esta gentalha devota às instituições democráticas, elas próprias garante do funcionamento do regime. Dou um exemplo : a teixeira da cruz, num discurso cheio de baboseiras, não se eximiu a referir 4 (quatro) vezes a situação de bancarrota do país, numa óbvia tentativa de pressionar o Tribunal Constitucional no que concerne à decisão sobre o confisco do 13º mês e do subsídio de férias dos funcionários públicos. Bem podem andar o passos coelho e o gasparzinho a tentarem convencer o mundo inteiro de que estamos no bom caminho, a recuperar economicamente, que o futuro é risonho e outras patranhas do mesmo quilate; bem pode o portas continuar o seu périplo digno de Ulisses (a grande questão é: será que tem uma Penélope à sua espera ? E, tendo-a, será que ela vai esperar eternamente ?) promovendo a excelência do nosso (des)governo (armado de pastéis de nata e couve portuguesa), bem podem bradar alto e bom som que o genial gasparzinho nos vai tirar do buraco e alcandorar-nos ao sétimo céu da produtividade e da competitividade (e de outras saloices que trazem sempre na boca); basta uma pequena entrevista entre-portas (?) de uma qualquer teixeira da cruz para ir tudo por água abaixo, ou seja, o afã de desvalorizar o Tribunal Constitucional é tão premente, de tal modo urgente, que a criatura nem se deu conta da facada que estava a dar na nossa imagem externa e interna. Mas, têm o que merecem: o desprezo a que votam as instituições democráticas tem um equivalente exacto no desprezo que o povo sente por eles.
Ontem, dia 23 de Abril (a que segue o dia de hoje, dia 24 de Abril), soubemos que a Associação 25 de Abril (com a legitimidade moral que lhe assiste) emitiu um comunicado no qual explica as razões pelas quais não participará este ano nas comemorações oficiais do 25 de Abril (e que pode ser lido na
íntegra aqui http://www.25abril.org/ ), assumindo uma posição ética e moral coerente com o comportamento e as atitudes dos militares que fizeram o 25 de Abril e constituindo o sobressalto cívico que urgentemente necessitamos. Desse manifesto respigo três excertos:

"O contrato social estabelecido na Constituição da República Portuguesa foi rompido pelo poder. As medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem-estar social atingem a dignidade da pessoa humana.

O rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão social, desvaloriza o trabalho.

Sem uma justiça capaz, com dirigentes políticos para quem a ética é uma palavra vã, Portugal é já o país da União Europeia com maiores desigualdades sociais."

Pegando na expressão "desvaloriza o trabalho", resta-me dizer que esta é, talvez, a faceta mais hedionda da actual ofensiva bandalha e liberal contra o mundo do trabalho. São tão estúpidos que consideram o salário como um custo, logo, algo que tem que ser reduzido à sua expressão mínima, em vez de o consideraram uma relação social; tão canalhas que consideram os direitos sociais como custos, não percebendo que uma sociedade é tanto mais rica quanto mais eficiente for na distribuição da riqueza. Estas verdades, de tão evidentes, não atingem os altos cumes em que as suas estúpidas inteligências vagueiam. A recompensa espera-os no fim da linha (se ainda houver linha), quando estiverem bem aboletados nas empresas dos parasitas que agora privilegiam e servem. Comemoremos pois o 25 de Abril, enquanto a canalha comemora o 24.

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