quarta-feira, 12 de maio de 2010

GALLIPOLI


GALLIPOLI

Pete Weir

Austrália, 1981


“They shall grow not old, as we that are left grow old.
Age shall not weary them, nor the years condemn.
At the going down of the Sun and in the morning
We will remember them”

Ode aos veteranos





Considerada um desperdício colossal, desnecessário e absurdo de vidas inocentes, a I Guerra Mundial torna-se uma lição, um marco incontornável da mensagem de aviso que pode ser lida pelas gerações mais jovens. Líderes políticos e cidadãos deveriam estar mais informados e mais atentos aos contornos desta temática, para que no futuro não seja tão fácil e tão leviano decretar o estado de guerra. Filmes sobre o conflito em questão nunca serão demais na medida em que, enquadrando a perspectiva histórica civilizacional, podem desenvolver pedagogicamente os seus conteúdos junto a uma população jovem habituada a fantasias sobre o tema da guerra. GALLIPOLI é um desses exemplos em que a guerra é documentada através do olhar de dois jovens, sem grandes considerações políticas nem delírios filosóficos. Archy (Mark Lee) e Frank (Mel Gibson) são dois corredores rivais nas pistas de atletismo do seu país. Com o eclodir da I Guerra Mundial, a Austrália vê-se envolvida por questões de fidelidade à coroa britânica. Archy, um jovem ingénuo, forte e corajoso, decide oferecer-se como voluntário. Frank, mais cínico e realista, resiste algum tempo à ideia, acabando por imitar o amigo no momento em que percebe que o alistamento lhe pode trazer vantagens. A primeira parte do filme decorre numa Austrália rural, onde Archy tem que apanhar um comboio para se ir alistar a Perth e atravessar o deserto, porque na sua terra natal não o aceitam dado ser menor de idade. A segunda parte do filme consiste na chegada e treino no Egipto do corpo expedicionário ANZAC (Australian New Zealand Army Corps) antes de entrar em acção. Finalmente o filme termina no cenário da batalha de Gallipoli na Turquia, local onde após ferozes combates que se arrastaram por nove meses, as tropas australianas e neo-zelandesas acabaram por retirar sem glória.
O sacrifício dessas mortes foi de tal ordem de grandeza que a partir de 1916, o dia 25 de Abril, “ANZAC’s day”, (data do desembarque em 1915) passou a ser comemorado na Austrália enquanto marco de afirmação nacional e patriótica encabeçado pelos RSL (Returned Serviceman’s League).
Se por um lado a defeituosa preparação da operação, as falhas de comunicação e a incapacidade de alguns aspectos do comando precipitou a tragédia, por outro lado a partir da sua participação na guerra, a jovem nação australiana adquiriu um estatuto de independência e de identidade nacional até aí inexistente. A inocência de um povo que se desloca milhares de quilómetros para combater numa guerra estranha acabou por revelar aspectos chave de uma identidade nacional. O sacrifício de rapazes como Archy, bem como o desperdício desse mesmo sacrifício acabariam por se inscrever no espírito de uma nação. No filme, Weir afasta-se do debate político bem como de considerações acerca do cinismo europeu ao sacrificar a ingenuidade dos seus aliados de além-mar. Por isso, o heroísmo, a camaradagem e o espírito de sacrifício destes jovens podem ser lidos em muitos outros contextos idênticos de guerra, sem que seja necessário proceder a grandes alterações. Alguém escreveu algures que a guerra é o sacrifício dos mais jovens e o egoísmo dos mais velhos…
Ao escolher a campanha de Gallipoli como um dos seus dias de celebração patriótica, a Austrália revela o seu modo de estar e de ser. Não se agradece a quem combateu pela liberdade, pela vitória ou sequer pela afirmação de uma verdade. Relembra-se tão só o significado da guerra para aqueles que nela participaram.

Artur

Mais informações sobre a campanha de Gallipoli podem ser consultadas aqui http://herdeirodeaecio.blogspot.com/2008/12/campanha-de-galpoli.html

3 comentários:

A.Teixeira disse...

Belo texto e... obrigado pela referência.

Artur Guilherme Carvalho disse...

António,
Sempre às ordens.Obrigado

Hélder disse...

Um prazer garantido na leitura dos teus textos.
Mesmo quando falas de guerra.
Afinal as palavras 'sacrifício' e 'desperdício' são tão ilustrativas do que é esta selvajaria sem sentido, onde os melhores tombam a maior parte das vezes, em nome de nada e a História transforma-os na importância de um sopro esvaído.
Fica o respeito dos que os recordam mas que não é nem nunca será o suficiente para os trazer de volta aos sonhos interrompidos.
Abraço, Master.