
RAÍZES
O português é uma das muitas línguas que nasce do latim, fruto das invasões romanas na Península Ibérica. A Cordilheira Cantábrica (séc. X) acabou por servir não só de barreira geográfica como de limite divisório de idiomas. O galego falava-se nas montanhas do Noroeste da Península e na capital do reino de Leão. Do outro lado da cordilheira, a Leste, na vizinhança do país basco formava-se outro dialecto, o castelhano. O galaico-português e o castelhano são irmãos com uma raiz comum, nascidos da mesma língua neo-latina, que evoluíram com o tempo em diferentes direcções. Nos nossos dias, uma e outra distinguem-se das restantes línguas românicas no vocabulário essencial, formas gramaticais análogas, o mesmo sistema de conjugações verbais. (*)
As principais distinções entre o português e o castelhano estão na entoação, articulação e ritmo, sugerindo que “na sua origem estão diferentes substratos, isto é, diferentes populações pré-romanas, que pronunciavam diferentemente o latim”. Quando se formou o reino de Portugal já o Noroeste da Península dispunha de uma identidade linguística, podendo afirmar-se a existência do galaico-português enquanto língua materna. O latim continuou a ser utilizado enquanto língua oficial nos primeiros tempos da nacionalidade. Afonso Henriques, Sancho I e Afonso III, escrevem os seus testamentos em latim. Mas em 1214, Afonso II, neto de Afonso Henriques deixou um testamento em português que consiste num dos primeiros documentos escritos na nossa língua.
Há já no ano de 1000, ou perto disso, manifestações que tendem a revelar uma certa autonomia cultural do Noroeste. Existem mosteiros cristãos moçárabes nas proximidades de Coimbra, (Vacariça e Lorvão), bem como no Norte do Douro. No princípio do reinado de Afonso Henriques é fundado o mosteiro de Sta. Cruz, de cónegos regrantes, onde se fabricam livros e onde se coleccionam anais latinos referentes à região. É de assinalr pela importância que veio a ter mais tarde, a fundação do Mosteiro de Alcobaça em 1152 por monges franceses.
Forma de comunicação, a língua é também o veículo privilegiado de afirmação e identidade nacional. Comunicar, pronunciar, escrever, falar. Eis um património que contribui decisivamente na construção de uma nação.
(*) Iniciação Na Literatura Portuguesa
António José Saraiva
Ed. Gradiva – Fevereiro 1994

“Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que os outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar, e que nos faz a nós moçambicanos, ficarmos mais Moçambique.”
Mia Couto
A obra de Mia Couto é talvez uma das mais paradigmáticas no que diz respeito à dinâmica de uma língua. A invenção de vocábulos e a forma de exprimir sentimentos utilizando a linguagem num processo de reconstrução, evidenciam a evolução linguística enquanto elemento activo e imprescindível no desenho de uma identidade. Espaço geográfico e cultural, formas de relacionamento comunitário e social, património histórico comum, tudo se mistura numa amálgama de regras, pronúncias e expressões que compõem uma língua. Tal como o português evoluiu do latim, assim os territórios de expressão portuguesa evoluem enquanto constroem a(s) sua(s) identidade. Mia Couto refere que a única forma de não se perder a influência do português em Moçambique é permitir que a língua portuguesa se possa “moçambicanizar”. Completamente de acordo. O que não pode acontecer é que a língua portuguesa acompanhe evoluções que não lhe dizem respeito ao pretender alcançar um padrão comum entre várias latitudes. Isso é pura e simplesmente ditar a sua sentença de morte.
ARTUR
2 comentários:
Concordo absolutamente com a narrativa do nascimento e identidade da nossa Língua. O AO só a descaracteriza das suas raízes históricas, e envergonha os portugueses mais atentos e mais exigentes com a etimologia e a lógica da gramática.
E a nossa língua lusitana original, autóctone, será que teria como resgatar???
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