segunda-feira, 7 de novembro de 2011

MARGINALIA

Marginalia: anotações, comentários, sublinhados, sinais gráficos deixados por um leitor na margem e à margem do texto impresso


"Não encontrarás novos países, não descobrirás novas margens. A cidade seguir-te-á..."





Sei de Kavafy pela paixão avassaladora de Marguerite Yourcenar: o grande espírito da escritora gostava de se apaixonar por homens que amavam outros homens. Essa qualidade do seu destino, que alguns considerariam trágica, tornou-se com o passar do tempo uma "imagem do pensamento", como diria Walter Benjamin, uma luz que ilumina uma zona obscura daquela que outrora foi Crayencour antes de ser Yourcenar.



Que poderia o velho Kavafy oferecer à jovem Marguerite ? O quê, para além dessa vagabundagem poética pelo Mediterrâneo, entre as ruínas do mundo grego e esses vislumbres de Adriano e do inalcançável Antínoo para o qual o Imperador, no auge da dor, mandou construir cidades e milhares de estátuas e ao qual erigiu um culto digno do jovem deus afogado nas águas do Nilo ? Curiosa inversão de papéis: Kavafy torna-se, de algum modo, um Antínoo idoso, poeta e sábio, e Marguerite desempenha o papel do amante que, não podendo consumar a paixão, dedica o resto da vida ao culto do amado desaparecido ainda em vida.



A sombra de Kavafy vagueia entre os velhos cafés de Alexandria, pára durante um momento frente às lojas de especiarias aspirando os odores misturados e apreciando as pirâmides de cores, compra uma laranja e fá-la rodar devagar entre as mãos enquanto se dirige para o porto. Marguerite não voltou a Alexandria. Não voltará jamais.



"Não digas que o teu ouvido te enganou ou que não era senão um sonho... Comovido, mas sem te abandonares às orações e às súplicas dos cobardes, experimenta um último prazer ao escutar os sons dos delicados instrumentos do cortejo divino, e saúda Alexandria, que não voltarás a ver"







1 comentário:

Publicado por Henar Ortega disse...

Arnaldo, és tao querido!

Mesmo agora vejo o teu comentario no meu blog onde tenho arrumadas as minhas publicaçoes. Obrigadísima pelas tuas palavras! Lembro-me inmenso de vocês, e há 6 anos daquilo, meu Deus 6 anos, nao posso acreditar, parece-me que foi ontem!

Tem a certeza que quando vou para Lisboa vos-ligo. Há muito que nao vou, por acaso... Tenho de ir.

Muitas saudades, vocês sao pessoal legalísimo.

Beijao e abraços.

Henar