segunda-feira, 28 de setembro de 2009

SERMÃO AOS MATRAQUILHOS, TIAGO, CONFISSÕES






(SERMÃO AOS MATRAQUILHOS)
Fala Tiago:
A garagem ficava numa casa perto de Colares e tornou-se rapidamente o nosso local de ensaio preferido. Estava relativamente isolada das outras casas, numa elevação de onde se tinha a vista privilegiada da Serra mesmo à nossa frente. Comecei a conhecer aquela casa nos últimos anos do liceu e apaixonei-me por ela quase ao mesmo tempo que me apaixonei pela Matilde. Uma e outra faziam uma enorme unidade onde cabia toda a minha existência. Uma tarde, andávamos ainda todos de mota, saímos atrás do crepúsculo húmido de sempre em direcção à praia. Havia muito vento e decidimos mudar de poiso. Voltámos a Colares pela estrada e subimos à direita a caminho de Monserrate. Um breve aceno quando passámos à porta do “Chora” e a noite cada vez mais escura sobre nós como um manto azul-escuro de neblina. Sem saber como, acabámos à porta da entrada do Castelo dos Mouros. Umas piadas de circunstância, umas frases adolescentes e decidimos entrar. Corremos caminhos entre bosques encantados e ameias esquecidas pelo tempo. Perto de uma das torres suspensas nas nuvens olhámo-nos como se fosse a primeira vez. E foi. A nossa “estreia” foi feita neste outro planeta agarrado ao nosso, mas que não lhe pertence. O nosso grito da primeira vez foi como uma explosão de duas almas, duas estrelas que colidiram para formar uma nova estrela, ainda mais brilhante. E por ali ficámos até de manhã, a olhar um para o outro com a ponta dos dedos, com o toque da pele, indiferentes a tudo.
Mais tarde voltámos ao castelo, mas desta vez dentro de um carro e com sacos camas lá dentro. A nossa torre passou a ser um Renault 5 estacionado na reentrância do caminho da entrada para o castelo. Parecia a nossa casa de férias, o anexo da nossa paixão. Era como se nos tivéssemos amado em cada metro do caminho de terra, em cada degrau de pedra, com a bênção de um bosque que respirava paz.
Não sei se me compreende agora, porque é que “isto” nunca mais… porque é que eu me recuso a…porque é que, depois de tudo isto é impossível voltar a atingir este grau de excelência com outra mulher…
Quando a Matilde desapareceu no mar, levou com ela a vida de várias pessoas. Deixou-as aqui a andar mas com o espírito noutras paragens. Ninguém escolheu assim, embora tenha sido isso que aconteceu.
(Fotos de Sofia P. Coelho)
ARTUR

3 comentários:

Clarice disse...

Ninguém aprende a perder... mas aprende-se a viver com as perdas, umas vezes resolvendo-as... outras vezes, nunca!

Clarice disse...

Ficou por dizer que dificilmente vou resolver o facto de ter perdido os Xutos no Restelo...;)

Artur Guilherme Carvalho disse...

Grande perda Clarice. Noite Mágica, fantástica, inesquecível. Volta sempre