Décimo oitavo dia do nono mês de dois mil e vinte e quatro.
É a ideia de mim a amar-te que ainda amo. Podias ter morrido ontem que me seria igual. Começaste a morrer no primeiro minuto em que me espancaste com as palavras de moribundo intoxicado pela poeiras castanhas do teu deserto emocional.
É a ideia de mim a amar que amo. Podias morrer num dia qualquer que eu já tinha enterrado a ideia de ti, daquilo que pensei que eras e daquilo que tu me fizeste pensar que era. Somente uma forma de chegares aos teus propósitos como num escadote, num caixote e eu Quixote, eternamente Quixote, a debelar moinhos de vento, sendo Dulcineia, Rocinante e Sancho, a iluminar-me nas noites pardas com a estrela menor como archote. É a ideia de amar acima de todas as coisas, a mim, a ti, ou a quem for, que alimenta a vida que quero simples,escorreita e límpida, sem rancores nem amargores pela constatação da existência de verdadeiros estupores como tu e os que te assemelham, sem chispa nem centelha, sugadores de esperança e bem aventurança, disseminadores de todos os vícios e dores.
É a ideia do amor que eu amo, é ele que me cura, acorda e adormece, me faz sonhar, questionar, acreditar e continuar.
É ele que eu vejo em todas as coisas que me rodeiam, na grandeza das almas que me cercam, no olhar de cada filha, do meu filho, da minha neta, duma amiga, dum amigo, do meu fiel escudeiro peludo de olhos de veludo, da égua que me abraça a cada chegada, das gatas que me seguem como a uma semelhante.
É a ideia de ser assim que me faz cultivar cada lugar de mim, reinventar cada queda e ser a minha própria escada, transformar em tudo o que antes era nada, ser no caos da calma a entrada.
Elsa Bettencourt
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