quinta-feira, 7 de maio de 2015

TAXINOMIAS




Foi-me dado ver o documentário "The Cell. Angelo Negri And The Prison", dirigido por Angela Melitopoulos em 2008, no qual o filósofo italiano declara de forma contundente : "os profetas já não existem".  Antonio Negri, professor de Filosofia e activista político condenado a vários anos de prisão, acusado de ter criado o corpus ideológico das Brigadas Vermelhas, pontua a sua reflexão falando da solidão do indivíduo politicamente comprometido. Em pleno século XXI o pensador encontra-se sozinho tanto do ponto de vista teórico como na prática política. O mundo transformado em "Império", tal como o próprio Negri afirma na obra que co-escreveu com Michael Hardt no ano de 2000 ("Imperio"), viu como surgiam novas construções do público, como se criavam democracias absolutas e como todo esse processo foi acompanhado de um certo acontecimento de insuficiência ao nível da análise lavada a cabo na esfera política. Negri constata que depois da morte dos profetas, nós os cidadãos estamos condenados a viver num mundo mais plano, tanto do ponto de vista afectivo como intelectual. A reflexão acaba por se transladar para uma hipótese interessante quando o filósofo se pergunta qual pode ser o lugar que ocupa a política entendida como formulação de novas formas de libertação do indivíduo.
Se procuramos referentes próximos das reflexões de Antonio Negri encontramos uma certa correspondência com os pensamentos formulados em 1998 por Jacques Rancière no livro "Aux bords de la politique": a morte dos profetas transforma-se na obra de Rancière em morte da política. O que agoniza depois da crise das grandes ideologias é a promessa. O que entra em crise é a possibilidade de poder transformar o mundo para alcançar o paraíso terrestre. A política carece de sentido porque não existe a utopia da mudança colectiva. Apesar disto, Rancière considera que o desejo de emancipação - ou de luta pela igualdade - continua mais presente do que nunca neste nosso tempo. Este desejo constitui o eixo de muitas lutas individuais ou colectivas, que por vezes actuam de forma disseminada e inorgânica. Uma resposta à situação pode passar pela consideração que depois do fim da política talvez tenha chegado o tempo do político. Este tempo do político caracteriza-se pela procura de novas formas de participação no público e pelo alimentar um sentimento colectivo baseado no desejo de intervenção. Coisa que, no nosso país, ainda se revela algo débil e inconsistente. De qualquer modo, as associações (no sentido lato do termo) que actuam na esfera pública (e não me refiro a todas aquelas que apenas se constituem como suportes de projectos políticos pessoais - Marinho Pinto et al.- ou como cisões de partidos com assento parlamentar) podem ser consideradas como uma multitude singular, muitas vezes sem vínculos determinados, caracterizando-se pelo desejo de resistirem a um mundo que lhes aparece como crescentemente estranho e perigoso.
Todas estas reflexões de recorte filosófico ressoam numa série de questões que têm a ver com o papel que ocupa hoje a arte como instrumento político e que se transladam facilmente para o mundo do audiovisual.Como pode o cinema actual participar do político ? A questão abres uma série de debates cujo epicentro não é só o que as câmaras mostram ou documentam, mas também a reflexão sobre como se pode chegar a encontrar uma forma crítica do político, que ajude a criar aquilo que Rancière designa na sua última obra como "espectador emancipado" ou, retornando ao político, "o cidadão emancipado".

Duas notas um pouco tardias mas ainda assim com algum sentido:

1. Se a canzoada (à esquerda e à direita) ladra, urra e grunhe contra Sampaio da Nóvoa, então, o homem deve valer a pena. Já tem o meu voto.

2. Se a canzoada (ppd e cds) ladra, urra e grunhe contra o cenário macro-económico do PS, então, essa proposta talvez faça sentido. Já tem o meu voto.

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